Revista Diversidades n.º 19 Periodicidade trimestral Ano 5 Janeiro, fevereiro e Março de 2008 Título: O Fascinante Mundo dos Talentosos Índice: Editorial O Atendimento Educativo dos Sobredotados: Ritmos Diferentes nos Estados Unidos, na Europa e em Portugal Definição, Características e Educação de Alunos Sobredotados A Intervenção Psicológica na Sobredotação Uma Realidade... Diferentes Olhares Uma Ida ao Teatro “Amor de Dom Perlimplim com Belissa em seu Jardim” Espaço Psi Legislação Livros Recomendados TIC - Tecnologias de Informação e Comunicação Formação Notícias Ficha Técnica: Directora: Maria José de Jesus Camacho Redacção: Serviços da Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação Revisão: Direcção de Serviços de Formação e Adaptações Tecnológicas Morada: Rua D. João n.º 57 9054-510 Funchal Telefone: 291 705 860 Fax: 291 705870 E-mail: revistadiversidades@madeira-edu.pt Grafismo e Paginação: Direcção de Serviços de Formação e Adaptações Tecnológicas ISSN – 1646-1819 Impressão: O Liberal Fotos:Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação / Kelly Ward / Estúdio Quattro Editorial: Maria José Camacho Directora Regional de Educação Especial e Reabilitação A ideia da existência de uma “inteligência superior” em determinadas crianças, jovens ou adultos constituiu-se, ao longo dos tempos, em campo de pesquisa por parte de muitos investigadores, na tentativa de compreender e ajustar respostas educativas e sociais para esta população específica. Herdeira dos resultados que as novas descobertas, avanços científicos, conhecimentos e saberes introduziram na área educativa, social e cultural, a sobredotação converteu-se num domínio de referência, conquistando um lugar proeminente na definição de práticas transversais e diferenciadas, protagonizadas por diferentes actores educativos. No entanto, pelas características de subjectividade que pode encerrar, consideramos que a ideia de sobredotação ainda não conseguiu libertar-se totalmente dos mitos a que frequentemente aparece associada, tornando-se fundamental o derrubar de obstáculos conceptuais neste campo e o reconstruir de um significado multidimensional e consensual que possibilite uma intervenção eficaz, ajustada, diferenciada, respeitadora e atenta às especificidades, condições e necessidades desta população. Neste número, para além de uma análise crítica ao Decreto-Lei n.º 3/2008, que define o Regime de Apoios Especializados na área da Educação Especial, deixamos aos nossos leitores a ocasião de estabelecer um confronto entre as opiniões de investigadores e técnicos e aqueles que, sentindo-se talentosos numa determinada área, tal como Fernão Capelo Gaivota, afirmam, de viva voz, procurar horizontes mais vastos de realização: “A maior parte das gaivotas não se querem incomodar a aprender mais do que os rudimentos do voo, como ir da costa à comida e voltar. Para a maior parte das gaivotas, o que importa não é saber voar, mas comer. Para esta gaivota, no entanto, o importante não era comer, mas voar.” (Richard Bach, 1989). Artigos O Atendimento Educativo dos Sobredotados: Ritmos Diferentes nos Estados Unidos, na Europa e em Portugal Ana Antunes & Leandro Almeida – Professores Catedráticos da Universidade do Minho Ao longo da história da humanidade sempre houve pessoas capazes de um desempenho muito superior e excepcional em diversas áreas (Colangelo & Davis, 1997; Cropley, 1999; Tannenbaum, 2000). Por exemplo, em Esparta, as competências militares eram muito valorizadas pelo que a “sobredotação” se caracterizava por excelentes desempenhos em combate, competições de lutas e liderança. Em Atenas, os rapazes das classes mais altas frequentavam escolas particulares onde aprendiam conteúdos académicos e realizavam treino físico. Aos rapazes mais velhos, os sofistas também ensinavam Matemática, Lógica, Retórica, Política, Cultura e Argumentação. Na Europa Renascentista, uma série de personagens sobredotadas manifestou-se em várias áreas (artistas, arquitectos e escritores), destacando-se, por exemplo, Miguel Ângelo ou Leonardo da Vinci (Colangelo & Davis, 1997). No entanto, a noção de comportamento sobredotado, inerente ao conceito de sobredotação, é relativamente recente. A esse respeito, Borland (2005) afirma que as crianças sobredotadas existem as far as I can tell, in the second decade of the 20th century as a result of a confluence of sociocultural and socio-political factors that made the creation of the construct useful (p. 3). Nesse sentido, compreendem-se os “avanços e recuos” que, por vezes, as políticas educativas, reflexo de actos políticos, assumem perante a sobredotação (Gallagher & Gallagher, 1994; Rudnitski, 2000). A definição de sobredotação não está isenta de inseguranças e de controvérsias (Acereda & Sastre, 1998). O conceito não é estático, está em constante evolução, sendo que a tendência actual é caracterizada pela consideração de outras variáveis além das cognitivas e da inteligência (Gallagher, 2000; Heller, 2007). A multiplicidade de conceitos acaba por traduzir a multiplicidade de critérios a ter em conta na definição de sobredotação, implicando que a avaliação seja também multi-referencial, abrindo, consequentemente, um leque diversificado de propostas de intervenção (Almeida & Oliveira, 2000). A Sobredotação nos Estados Unidos da América Nos Estados Unidos da América (EUA) o interesse actual pela sobredotação é resultado da intersecção de diversos movimentos educativos com alguns acontecimentos históricos. As primeiras medidas de atenção à sobredotação foram adoptadas no século XIX (iniciando-se em 1870, em Saint Louis), caracterizando-se, sobretudo, pela aplicação em alguns estados de várias formas de aceleração escolar, que permitiam aos alunos brilhantes uma progressão mais rápida nos estudos em relação aos colegas (Colangelo & Davis, 1997). No século XX (1901) foi criada a primeira escola especial para alunos sobredotados em Massachusetts, seguindo-se a criação progressiva de aulas especiais noutros estados. No início dos anos 20, mais de metade das grandes cidades tinham algum tipo de programa de atendimento aos alunos sobredotados nos EUA. No entanto, durante as décadas de 20 e 30 houve uma diminuição do interesse na educação destes alunos. Por um lado, as questões de igualdade e democracia assumiram uma grande repercussão, colocando-se a tónica na acepção do indivíduo comum, do que não se afasta da norma e, por outro lado, a Grande Depressão levou a que as pessoas se preocupassem, essencialmente, com questões de sobrevivência, sendo que a educação dos sobredotados não constituía uma prioridade. O lançamento do satélite Sputnik pela União Soviética, em 1957, revelou-se o acontecimento histórico que mais condicionou o empenho crescente dos EUA na promoção da educação dos alunos sobredotados. Para não serem ultrapassados, entraram em competição com os soviéticos e desencadearam uma série de medidas de identificação e de intervenção com alunos sobredotados (Colangelo & Davis, 1997; Tannenbaum, 2000). A eleição de J. F. Kennedy, com as suas apostas na meritocracia, sobretudo no desenvolvimento científico e na lealdade ao País, contribuiu, no início da década de 60, para a continuidade do investimento nas pessoas sobredotadas. No entanto, esse entusiasmo foi diminuindo devido a outros acontecimentos que pressionaram o desvio da atenção dos sobredotados para essas problemáticas (por exemplo, movimentos pelos Direitos Civis, pela integração escolar e pela educação compensatória ou a guerra do Vietname) (Tannenbaum, 2000). Porém, na década de 70, verificou-se um novo interesse na temática da sobredotação, o qual se tem mantido e crescido até aos dias de hoje. Foi nesse cenário que Marland (1972) apresentou a primeira definição formal de sobredotação, a qual instigou os diversos estados a constituírem mecanismos de atenção à educação dos sobredotados. Em 1990, todos os estados americanos já tinham decretado legislação sobre esta temática (Pérez & Losada, 2006). Mas, à luz de uma educação inclusiva e igualitária não tem sido definido um suporte legal tão extenso para os alunos sobredotados como para os alunos com dificuldades (Karnes & Marquardt, 1997). Mais recentemente, em 2002, a introdução da nova lei federal (Public Law 107- 110), conhecida pela designação No child left behind (NCLB), tem desencadeado alguma contestação nos EUA. Advoga que nenhuma criança “seja deixada para trás”, mas não considera, claramente, as necessidades dos alunos sobredotados. Gallagher (2004) refere que a ideia subjacente de melhorar a aprendizagem de todos os alunos e diminuir a distância entre os alunos em risco e os alunos sobredotados deve alertar os educadores e os pais dos alunos sobredotados que, se estes ficarem sem a intervenção necessária, podem ser os alunos que ficam, realmente, de fora. Mas, apesar das dificuldades de equilíbrio entre a igualdade e a excelência, em todos os estados dos EUA existe legislação e diversas escolas e comunidades têm programas e serviços de atendimento aos alunos sobredotados (Gallagher, 2000; Pérez & Losada, 2006). A Sobredotação em alguns Países Europeus A Europa é um continente de uma diversidade cultural, ideológica e económica muito grande, o que também se reflecte no sistema educativo e, consequentemente, na educação dos sobredotados, sendo que estes têm sido tratados com alguma ambivalência ao longo dos anos (Mönks & Pflüger, 2005; Persson, Joswig & Balogh, 2000). De acordo com alguns autores (Pérez & Losada, 2006; Alonso et al., 2003), a atenção à educação dos alunos sobredotados recebe um especial destaque com a Recomendação do Conselho da Europa n.º 1248, em 1994. Mais concretamente, o Conselho da Europa recomenda que sejam tidas em conta, nas políticas educativas de cada Estado, as necessidades de legislação, de promoção da investigação, de formação de professores, de análise da resposta educativa específica dentro do sistema escolar regular e das medidas que não promovam a atribuição de rótulos, prejudicando os alunos. Para uma melhor caracterização da situação a nível europeu, além da União Europeia, recorremos aos dados de um estudo realizado por Persson e colaboradores (2000), onde conseguiram informação relativa a 25 dos 40 países europeus. Seguimos, como os autores, agrupando os dados por três grupos geográficos: a zona Norte da Europa; a zona Central, Oeste e Sul da Europa e a zona Este da Europa, incluindo os Balcãs e a Ucrânia. Zona Norte da Europa A zona Norte da Europa inclui a Escandinávia, as ilhas Britânicas, a Rússia e os estados do Báltico. Na Escandinávia, incluindo a Dinamarca, a Noruega, a Suécia e a Finlândia, encontramos uma posição bastante distinta dos outros países europeus face à educação dos sobredotados. Inserido num modelo caracterizado por um ideal de interdependência entre as pessoas e uma relutância em criar um sistema de políticas que recompense ou promova a excelência de uns sobre os outros, a sobredotação, sobretudo na Dinamarca, na Noruega e na Suécia é percebida sob a “Law of Jante” (expressão do novelista dinamarquês Aksel Sandemose, em 1993), a qual significa a desadequação do orgulho pessoal, ou seja, de que ninguém se deve sentir especial. Nas ilhas Britânicas a postura educativa é um tanto paradoxal. O reconhecimento e o desenvolvimento das altas habilidades têm sido uma parte integrante da sociedade inglesa (a tradição de escolas muito prestigiadas para uma elite). No entanto, este interesse é fruto de uma espécie de separação de classes, que tem gerado alguns conflitos entre as classes de estatuto social mais elevado e as classes de estatuto social baixo. Apesar destas escolas serem reconhecidas pela sua excelência e terem muita tradição, não parecem contribuir para o reconhecimento da educação dos sobredotados como uma necessidade no sistema escolar nacional. O processo de reconhecimento das necessidades especiais dos sobredotados e da educação inclusiva tem sido longo e, de alguma forma, separado das decisões políticas e legislativas. Na Rússia e na antiga União Soviética, antes da Revolução de Outubro, em 1917, as crianças talentosas nas áreas de pintura, ballet e música deslocavam-se para escolas com tradição, em Moscovo e em São Petersburgo. No entanto, a crença de que a Rússia tem uma longa tradição na educação de sobredotados, por exemplo, em Ciências e em Matemática, é falsa. Uma atenção maior foi despoletada, como nos EUA, em consequência da Guerra Fria, sendo que a primeira escola especial de nível secundário, destacando o ensino da Matemática, foi criada em 1959 (Persson et al., 2000). Actualmente, além do desenvolvimento de programas de enriquecimento (os russos chamam-lhes programas de aprofundamento em vez de programas para sobredotados) existem escolas especiais e classes especiais em várias áreas como, por exemplo, Matemática, Ciência e Tecnologia (Jeltova & Grigorenko, 2005; Persson et al., 2000). Zona Central, Oeste e Sul da Europa Nas zonas Central, Oeste e Sul da Europa, que incluem os seguintes países: Áustria, Bélgica, França, Alemanha, Itália, Portugal, Suíça, Espanha e Holanda, a política educativa tende a ser inclusiva, defendendo que, idealmente, a educação deve ser integrada no sistema escolar regular, como também defende a declaração de Salamanca (1994). Partindo daí, em alguns países, a legislação é generalista em relação aos alunos sobredotados, mas permite a intervenção com os mesmos, na medida em que são alunos a quem deve ser permitido o desenvolvimento do seu potencial. Alguns estados concebem a aceleração (entrada antecipada ou avanço de ano(s) lectivo(s) mais rapidamente) e o enriquecimento (diferentes formas de enriquecimento são desenvolvidas nestes países) como medidas de intervenção legisladas e reconhecidas para os casos de sobredotação. Zona Este da Europa Na zona Este da Europa, países como a Bulgária, a Croácia, a Hungria, a Polónia, a Roménia, a Eslováquia, a Eslovénia e a Ucrânia reconhecem, de uma forma geral, a sobredotação na legislação. Legislação esta que foi introduzida, sobretudo, nos anos 90, depois da era comunista. No entanto, já antes do período comunista, havia a tradição de classes especiais, workshops e cursos, que foram tolerados e permitidos pelas autoridades na condição de aqueles talentos serem “embaixadores” da promoção dos ideais do Estado Comunista a nível internacional. Nesse sentido, as áreas de eleição incluíam o desporto, as artes e as ciências. Actualmente, têm sido notados grandes avanços e esforços na regulamentação e sustentação destes países na educação da sobredotação. A Sobredotação em Portugal Em Portugal esta é uma problemática que permaneceu adormecida, na sociedade e no contexto escolar, durante muitos anos. Só a partir da década de 80 a questão foi sendo levantada por algumas associações privadas de pais e de professores (DaSilva, 1997). Mais recentemente, alguns técnicos têm manifestado interesse em estudar esta problemática, reflectindo-se também este interesse em propostas de investigação e de intervenção, bem como na realização de alguns encontros científicos e na criação de associações (Miranda & Almeida, 2002; Mönks & Pfl üger, 2005). Por exemplo, em 1986, realizou-se a 1.ª Conferência Internacional sobre Crianças Sobredotadas, numa iniciativa da Associação Portuguesa de Crianças Sobredotadas - APCS (associação criada nesse mesmo ano). Em 1989, em Lisboa, é criado por pais e professores o Centro Português para a Criatividade, Inovação e Liderança - CPCIL (Martins, 1997). Em 1996, o Departamento de Educação Básica (DEB) lançou, em articulação com o CPCIL, o “Projecto de Apoio ao Desenvolvimento Precoce” – PADP - com o objectivo de promover o desenvolvimento de alunos com precocidade intelectual ao nível do ensino básico em algumas escolas piloto (Martins, 1997). Dois anos mais tarde, o DEB organizou um programa de Verão, convidando 150 participantes do 3.º e 4.º anos de escolaridade, o qual pode ser considerado o primeiro programa oficial, no nosso País, para alunos com altas capacidades (Persson et al., 2000). Nesse mesmo ano, o Ministério da Educação também fez chegar às escolas portuguesas um documento intitulado “Crianças e jovens sobredotados: Intervenção educativa” com indicações de caracterização e de intervenção com estes alunos (Senos & Diniz, 1998). Também em 1998, foi criada mais uma associação, a Associação Nacional para o Estudo e Intervenção na Sobredotação – ANEIS, tendo várias delegações espalhadas por várias zonas do País. Actualmente, as quatro associações referidas continuam a desenvolver trabalho, tendo em comum alguns pontos: a formação de pais e educadores, a consulta e apoio a alunos, a realização de programas de enriquecimento e a organização de encontros de formação. Existe, ainda, uma outra associação, que, dada a publicidade mediática que tem desenvolvido, tem sido bastante divulgada junto da população. Referimo-nos ao Instituto da Inteligência e a valência Academia de Sobredotados, uma instituição privada que funciona desde 1999. Do ponto de vista legislativo a consideração destes alunos ainda não é clara. A Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE), a Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, em vigor desde 1986, consagra e defende igualdade de oportunidades no acesso e sucesso escolares a todos os alunos (Miranda & Almeida, 2002). Nessa linha, os alunos com altas capacidades não podem ser segregados ou omitidos, devendo a escola procurar responder às suas individualidades e promover o desenvolvimento do seu potencial. No entanto, a legislação portuguesa não tem sido explícita em relação à sobredotação, revelando-se a dificuldade em legislar sobre este assunto (Pereira, 2004) e não abarcando os alunos sobredotados no regime de educação especial redefinido recentemente (Decreto Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro). Encontra-se regulamentada a entrada antecipada no 1.º ciclo ou a conclusão do 1.º ciclo com 9 anos de idade, podendo completar o 1.º ciclo em três anos, e o “salto de um ano” durante a frequência do 2.º ou do 3.º ciclo de escolaridade (Despacho Normativo n.º 30/2001, de 30 de Junho), bem como a possibilidade de realização de programas de desenvolvimento dirigido aos alunos com resultados excepcionais (Despacho Normativo n.º 50/2005, de 20 de Outubro). A Região Autónoma da Madeira (RAM), no entanto, destaca-se em Portugal - face ao Continente – pela maior tradição e trabalho feito nos campos da identificação e apoio aos sobredotados. Há mais de dez anos que na Madeira o tema justificou orientações em termos de políticas educativas, tendo inclusive dado origem à formação de professores e outros técnicos de apoio, em particular porque desde o início se procurou apoiar as várias formas de talento que não apenas o intelectual e o académico. Assim, a RAM adopta legislação específica para estes alunos (Decreto Regulamentar Regional n.º 13-A/97/M, de 15 de Julho e Decreto Regulamentar Regional n.º 16/2005/M, de 17 de Dezembro), permitindo desencadear várias acções em prol dos alunos sobredotados através de unidades próprias dependentes da Direcção Regional da Educação Especial e Reabilitação (DREER). Conclusão Durante o século XX, aconteceu o despertar para o estudo da sobredotação, sendo que a educação dos alunos sobredotados foi assumindo uma importância crescente. Para isso contribuíram diversos movimentos educativos mas também alguns acontecimentos históricos. O interesse pela sobredotação parece estar associado a determinados momentos da História, que podem estimular ou inibir o investimento nesta área. Situações de crise parecem despoletar o interesse pelos alunos sobredotados, na medida em que é depositada neles a esperança da mudança face a determinada problemática (Gallagher & Gallagher, 1994). Por outro lado, parece difícil equilibrar a opção de política educativa pela excelência e pela igualdade, tanto nos Estados Unidos da América como na Europa. Na América, apesar de alguma tradição na educação destes alunos e dos vários estudos realizados, parece que, em termos de legislação federal, a referência explícita a estes alunos não tem acontecido nos últimos anos. Na Europa, os diferentes países têm adoptado diferentes linhas de actuação. Na zona Central, Oeste e Sul da Europa, sob o ideal de uma política educativa inclusiva, diversos países tendem a formular uma legislação generalista face aos alunos sobredotados (Persson et al., 2000). Portugal integra-se neste grupo de países, onde não existem normativas específicas em relação aos alunos mais capazes (excepção feita à Região Autónoma da Madeira), revelando-se na escola uma dificuldade maior em desencadear procedimentos de identificação e de intervenção sem enquadramento legal (DaSilva, 2000). Parece-nos que, apesar dos avanços encontrados na literatura e da existência de crianças e de jovens capazes de realizações excepcionais, a consagração dos seus direitos à realização plena ainda não está contemplada nas políticas educativas de muitos países. Por isso, ainda se colocam desafios inerentes à desmistificação da problemática, à percepção de elitismo e à estigmatização que daí pode ocorrer. Bibliografia Acereda, A. & Sastre, S. (1998). La superdotación. Madrid: Editorial Síntesis. Almeida, L. S. & Oliveira, E. P. (2000). Os professores na identificação dos alunos sobredotados. In L. S. Almeida, E. P. Oliveira & A. S. Melo (Orgs.). Alunos sobredotados: Contributos para a sua identifi cação e apoio. Braga: ANEIS. Alonso, J. A., Alvarez, M., Cretu, C., Ary, J., Peixoto, L. C., Varela, J. E Morgan-Cuny, S. (2003). Políticas educativas internacionales para alunos com sobredotación intelectual. In J. A. Alonso, J. S. Renzulli & Y. Benito. Manual internacional de superdotados: Manual para profesores y padres. Madrid: Editorial EOS. Borland, J. H. (2005). Gifted education without gifted children: The case for no conception of giftedness. In R. J. Sternberg & J. E. Davidson (Eds.). Conceptions of giftedness. Cambridge: Cambridge University Press. Colangelo, N. & Davis, G. A. (1997). Introduction and overview. In N. Colangelo & G. A. Davis (Eds.), Handbook of gifted education. Boston: Allyn and Bacon. Conseil de L’Éurope – Comission de la Culture et de l’Education (1994). Recommandation 1248 relative à l’education des enfants surdués. Cropley, A. J. (1999). Defi nitions of creativity. In M. A. Runco & S. R. Pritzker (Eds.), Encyclopedia of Creativity, vol. I (pp. 511-524). San Diego, Califórnia: Academic Press. DaSilva, M. (1997). A criança sobredotada vista pelos pais. In Actas da Conferência sobre Sobredotação. Lisboa: Ministério da Educação, Departamento de Educação Básica. DaSilva, M. (2000). Sobredotação: conceito, formas de identificação e intervenção. In L. Almeida, E. Oliveira & A. Sofia (Orgs.). Alunos sobredotados: contributos para a sua identificação e apoio. Braga: ANEIS. Gallagher, J. J. (2000). Changing paradigms for gifted education in the United States. In Heller, K. A., Mönks, F. J., Sternberg, R. J. & Subotnik, R. F. (Eds.), International handbook of giftedness and talent. Oxford: Elsevier. Gallagher, J. J. (2004). No Child Left Behind and Gifted Education. Roeper Review, 26 (4), pp. 121-123. Gallagher, J. J. & Gallagher, S. A. (1994). Teaching the gifted child. Boston: Allyn and Bacon. Heller, K. A. (2007). Scientific ability and creativity. 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Análise do anteprojecto do Dec. Lei da Reforma da Educação Especial e do Apoio Sócio-Educativo: Avanços e retrocessos. Sobredotação, 5, pp. 171-178. Pérez, L. F. & Losada, L. (2006). Perspectiva internacional en la educación de alumnos com capacidad superior. In L. F. Pérez (coord.), Alumnos con capacidad superior: Experiencias de intervención educativa. Madrid: Editorial Síntesis. Persson, R. S., Joswig, H., & Balogh, L. (2000). Gifted education in Europe: Programs, practices, and current research. In Heller, K. A., Mönks, F. J., Sternberg, R. J. & Subotnik, R. F. (Eds.), International handbook of giftedness and talent. Oxford: Elsevier. Public Law 107-110, the No child left behind Acto f 2001. Rudnitski, R. A. (2000). National/provincial gifted education policies: Present state, future possibilities. In Heller, K. A., Mönks, F. J., Sternberg, R. J. & Subotnik, R. F. (Eds.), International handbook of giftedness and talent. Oxford: Elsevier. Senos, J. & Diniz, T. (1998). 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Palavras-chave: definição de sobredotação, identificação e características do sobredotado, educação dos alunos sobredotados. Definição de Sobredotação Durante muitos anos, psicólogos, nomeadamente os da área da psicometria, seguindo os passos de Lewis Terman, em 1916, associavam sobredotação1 a QI’s elevados. Este legado sobreviveu até à actualidade, em que sobredotação e QI elevado continuam, por parte de muitos, a ser considerados sinónimos. Não obstante esta constatação, desde muito cedo, outros investigadores (e.g., Cattell, Guilford e Thurstone) sustentaram a hipótese de que a inteligência não pode ser expressa de forma unitária e sugeriram múltiplas abordagens do conceito. Dados da investigação conduzida nos anos 80 e 90 do século XX provam a existência de múltiplas componentes a integrar a noção de inteligência. Este facto é particularmente observado por Robert Sternberg e Davidson na sua obra Conceptions of Giftedness e nas obras de Howard Gardner (1983, 1993). As diferentes concepções de inteligência apresentadas nestas obras, embora distintas umas das outras, estão inter-relacionadas de várias formas. A maioria dos investigadores define sobredotação em termos de múltiplas qualidades e nem todas são de origem intelectual ou cognitiva. O QI é, por vezes, visto como uma medida inadequada da sobredotação. A motivação, a elevada auto-estima e a criatividade são qualidades-chave nas definições de sobredotação apresentadas por estes autores. A definição de Joseph Renzulli (1978) é uma das que apresenta melhor fundamentação científica. A definição de Renzulli inclui comportamentos sobredotados em vez de indivíduos sobredotados e é composta por três componentes. O comportamento sobredotado consiste nos comportamentos que reflectem uma interacção entre três clusters de características humanas: (1) capacidades acima da média, (2) níveis elevados de envolvimento na tarefa e (3) níveis elevados de criatividade. Os indivíduos capazes de desenvolver um comportamento sobredotado são aqueles que sendo capazes de desenvolver este trio de características, aplicam-no a uma determinada área de performance humana. Em consequência, as pessoas que são capazes de desenvolver uma interacção entre estes três clusters requerem uma larga variedade de oportunidades educacionais e serviços que não são oferecidos no dia-a-dia escolar através dos currículos académicos regulares. Johnsen (2004) explicita que todas as crianças sobredotadas apresentam um potencial de alta performance nas áreas incluídas na definição federal americana2 de aluno sobredotado ou talentoso, ou seja, gifted and talented when used in respect to students, children, or youth means students, children, or youth who give evidence of high performance capability in areas such as intellectual, creative, artistic, or leadership capacity, or in specific academic fields, and who require services or activities not ordinarily provided by the school in order to fully develop such capabilities. (Johnsen, 2004, p. 388). Neste contexto, um aluno sobredotado ou talentoso significa uma criança ou um jovem que mostra um potencial remarcável e elevado nível de performance, quando comparado com os pares da mesma idade, experiência ou origem social. São alunos que demonstram elevadas capacidades intelectuais, criativas ou artísticas, possuem uma capacidade de liderança fora do comum e sobressaem numa determinada área académica. As principais características destas definições são, em suma, as seguintes: (a) a diversidade de áreas em que a sobredotação pode ser demonstrada (e.g., intelectual, criatividade, artística, liderança, académica), (b) a comparação com outros grupos (e.g., com os pares da mesma idade, experiência ou origem sociocultural) e (c) o uso de termos que impliquem a necessidade de desenvolvimento de um talento (e.g., capacidade e potencial). Características dos Alunos Sobredotados Muitos estabelecimentos de ensino usam uma variedade de instrumentos para medir as capacidades das crianças sobredotadas (Johnsen, 2004). Estes instrumentos incluem portefólios dos trabalhos escolares dos alunos, observações na sala de aula, classificações académicas e testes de inteligência. Muitos professores e psicólogos educacionais, especializados no assunto, estão de acordo quanto ao facto de não existir uma medida isolada para identificar uma criança sobredotada. Nas medidas de identificação e diagnóstico mais usadas estão os resultados obtidos nos testes de inteligência que, se forem significativamente superiores à média, podem indiciar casos de sobredotação. Alguns testes de QI vão mais longe e descrevem vários tipos de sobredotação (Gross, 1993): brilhante (1 caso em 6; percentil 84); moderadamente sobredotado (1 caso em 50; percentil 97.9); altamente sobredotado (1 caso em 1000; percentil 99.9); excepcionalmente sobredotado (1 caso em 30.000; percentil 99.997) e profundamente sobredotado (1 caso em 3.000.000; percentil 99.99997). A maioria dos testes de QI não apresentam esta capacidade de discriminação de níveis e são talvez mais eficazes no diagnóstico diferencial do que na distinção de níveis de sobredotação. O próprio inventor da WAIS (Wechsler Adult Intelligence Scale) admitiu que a mesma seria usada para avaliar sujeitos situados no intervalo da média (entre 70 e 130) e não para avaliar os extremos da população. O teste de inteligência de Stanford-Binet forma L-M, actualmente fora de moda, foi o único teste que teve um tecto suficiente para identificar a excepcionalidade e a sobredotação profunda. Contudo, devido ao facto do instrumento estar ultrapassado, os resultados obtidos através do mesmo geram dados inadequados ou inflacionados. O Stanford-Binet forma V e a WISC IV (Wechsler Intelligence Scale for Children – Fourth Revision), ambos recentemente revistos, são, de momento, os instrumentos mais adequados para avaliar este tipo de população. A maior parte dos testes de QI são apenas possíveis para crianças em idade escolar. Crianças mais novas têm de ser cuidadosamente examinadas por psicólogos educacionais especializados para determinar o nível de QI. O mesmo cuidado terá que ser tido com aqueles que apresentam talentos especiais, em áreas como as artes e a literatura, pois tendem a apresentar fracos desempenhos em testes de QI, que apelam, em geral, a escalas verbais e matemáticas. Enquanto que muitas pessoas pensam que a sobredotação é uma mera diferença quantitativa, medida através de testes de QI, um número significativo de estudiosos descreve a sobredotação como uma diferença fundamentalmente no modo de perceber o mundo, que afecta todo o quotidiano do indivíduo sobredotado. Estas diferenças não desaparecem quando as crianças sobredotadas se tornam adultas ou quando abandonam a escola. Crianças e adultos sobredotados são amplamente reconhecidos como população especial, mas acima de tudo, eles continuam a ter necessidades especiais a nível psicológico, social e emocional, motivadas pela excepcionalidade da sua inteligência. A dimensão socioemocional, apesar da sua importância, tem recebido menor atenção dos estudiosos, do que a dimensão cognitiva (e respectivas respostas às necessidades educacionais do sobredotado). Entre outros aspectos, a assincronia entre distintas dimensões do desenvolvimento, o perfeccionismo, a hipersensibilidade, o sub-rendimento e factores a eles associados são aspectos de particular relevância na abordagem da sobredotação. É, portanto, necessário favorecer o ajustamento pessoal e emocional do sobredotado, promover o seu desenvolvimento social e fortalecer um autoconceito positivo (Tannenbaum, 1983). Terman (1965) realizou um estudo longitudinal com uma amostra de 1528 indivíduos sobredotados, identificados através de testes de QI durante a infância e acompanhados ao longo de várias décadas. Uma das conclusões desta investigação é o facto de que, contrariamente às concepções prevalentes no início do século XX, os sobredotados apresentavam, além de uma inteligência superior, um desenvolvimento físico mais acelerado, eram mais ajustados socialmente e mais estáveis do ponto de vista psicológico. No entanto, a amostra investigada apresentava um QI médio de 150 e os participantes pertenciam a um estatuto socioeconómico médio e muitos deles eram referenciados pelos seus professores para compor a referida amostra. O próprio Terman reconheceu que as crianças que tinham um QI extremamente elevado (acima de 170) apresentavam dificuldades de ajustamento social, sendo considerados pelos seus professores como solitários e pouco hábeis no relacionamento com os seus pares (Burks, Jensen & Terman, 1930, citados por Gross, 2002). Outros estudos, como o estudo clássico de Hollingworth (1942) e o de Gross (1993, 2002), com amostras de alunos com QI extremamente elevado (igual ou superior a 180), têm apontado problemas de ajustamento e dificuldades emocionais, que são menos frequentes entre sobredotados cujo QI esteja na faixa de 130 a 170. Estudos muito actuais apontam, de facto, para a necessidade de orientação ao sobredotado e à sua família e de um sistema educacional que reconheça e atenda as necessidades desse aluno nas áreas, não só cognitiva e intelectual, mas também social e emocional (Alencar, 2007). Educação de Alunos Sobredotados O facto dos alunos sobredotados dominarem algumas áreas acima da média das crianças e jovens da sua idade pode contribuir para alguma exclusão social por parte dos seus colegas da escola. A sua independência rebelde e a procura de cada vez mais saber pode ser também um problema para os professores, uma vez que estes alunos se encontram num nível superior ao dos seus colegas, necessitando de actividades mais complexas e motivadoras. Quando o aluno não está devidamente enquadrado, surgem comportamentos desajustados, de oposição de conduta, numa tentativa de chamar a atenção sobre si (Serra, 2004). Estes alunos nem sempre são bem compreendidos e uma má gestão por parte do meio escolar, familiar e/ou social poderá levar a consequências desastrosas para a vida da criança ou do adolescente. Serra (2004) apresenta-nos três níveis de consequências: a socioemocional, a escolar e a familiar. Na vertente socioemocional, as consequências podem desencadear irritabilidade, sentimento de inferioridade, culpabilização externa, isolamento, baixa auto-estima, rejeição de valores, descrença em si próprio, passividade, tendências suicidas e procura de marginalidade. Na vertente escolar, as consequências duma má gestão poderão resultar em insucesso académico, atitude negativa face à escola, apatia, desatenção, irreverência, falta de persistência, culpabilização dos professores pelos insucessos, desinteresse, hiperactividade e preferência pelos grupos marginais. Na vertente familiar, destaca-se o aparecimento da agressividade, instabilidade emocional, isolamento, arrogância, intolerância, desobediência, infelicidade e sentimento de rejeição. Para que cada caso possa ser tratado de forma conveniente é importante sensibilizar a escola, a família e a comunidade em geral, de forma a não desperdiçar os talentos apresentados pelo grupo dito “sobredotado”. A aceleração escolar pode constituir uma resposta educativa aos alunos sobredotados (Oliveira, 2007), assim como um meio essencial que garanta ao cérebro a estimulação de que precisa, o que pode ser conseguido através do currículo diferenciado (Mönks, & Pflüger, 2005; Serra, 2004). Apresentam-se, de seguida, algumas sugestões para pais e profissionais de educação, dentro das quais se salientam apenas as que se encontram relacionadas com as várias etapas de escolarização, desde a creche ao ensino secundário, a saber: enriquecer o vocabulário através da leitura de histórias; enriquecer a experiência de vida em todas as possíveis direcções; elogiar e reconhecer o seu trabalho; estimular sempre a fazer mais e melhor, mostrando-lhe de que é capaz; ajudar a lidar com o insucesso; permitir que experiencie uma variedade de técnicas e de materiais; criar situações problemáticas motivando a procura da resolução; aumentar a sua autoconfiança face aos outros; promover actividades que enriqueçam as relações entre os pares; aumentar o grau de responsabilidade, fazendo-o cumprir o que se propõe e compromete a fazer; provocar situações favoráveis ao desenvolvimento de capacidades de liderança (colocando-o a liderar um jogo, uma actividade ou a realização de uma tarefa); originar momentos em que seja pedido para imitar pessoas, animais ou mesmo colegas; solicitar que faça uma história ou relate uma situação; consciencializá-lo da capacidade de desencadear nos outros respostas emocionais diferentes, conforme a sua atitude. Nota Final Actualmente, o apoio educativo aos alunos sobredotados é, de facto, uma realidade na maioria dos países europeus. No século passado, a maioria era de opinião de que estes alunos não necessitavam de apoios educativos especiais. Consequentemente, a hipótese de desenvolver apoios educativos para os alunos sobredotados foi completamente rejeitada. Apenas nas duas últimas décadas é que foi amplamente reconhecido e aceite que todas as crianças necessitam de apoio ajustado às suas capacidades, sejam elas baixas ou altas, no sentido de desenvolver as suas potencialidades ao máximo possível (Mönks & Pflüger,2005). Como atrás foi exposto, os procedimentos para desenvolver estas potencialidades exigem uma dedicação pessoal por parte dos educadores e das famílias e um tipo especial de suporte social. Um curriculum diferenciado é indispensável para a promoção da igualdade de oportunidades para todos. Este objectivo só será atingido se houver organizações escolares flexíveis, diversidade de métodos e práticas pedagógicas e enriquecimento dos conteúdos programáticos em determinadas matérias. Nestas condições, crianças e adolescentes sobredotados podem desenvolver-se de acordo com as suas necessidades educativas e desenvolvimentais. 1 Na literatura da especialidade encontramos os termos high ability, giftedness e talent que são usados como sinónimos. 2 Esta definição foi adoptada por quase todos os estados americanos (e.g. 74th legislature of the State of Texas, Chapter 29, Subchapter D, Section 29.121). Referências Bibliográficas Alencar, E. (2007). Características sócio-emocionais do superdotado: questões atuais, Psicologia em estudo, 12 (2) Maio/ago. Gardner, H. (1983). Frames of mind: The theory of multiple intelligences. New York: Basic Books. Gardner, H. (1993). Multiple intelligences. The theory in practice. New York: Basic Books. Gross, M. U. M. (1993). Nurturing the talents of exceptionally gifted individuals. In K. A. Heller, F. J. Mönks & A. H. Passow (Eds.), International handbook of research and development of giftedness and talent (pp. 473-490). Oxford: Pergamon. Gross, M. U. M. (2002). Social and emotional issues for exceptionally intellectually gifted students. In M. Neihart, S. M. Reis, N. M. Robinson & S. M. Moon (Eds.), The social and emotional development of gifted children (pp. 19-30). Waco: Pufrock. Hollingworth, L. (1942). Children above 180 IQ: Origin and development. New York: World Books. Johnsen, S. K. (2004). Identifying Gifted Students: A Practical Guide. Waco, Texas: Prufrock Press, Inc. Mönks, F.J. & Pflüger, R. (2005). Gifted Education in 21 European Countries: Inventory and Perspective, Nijmegen: Radboud University Nijmegen. Oliveira, E. P. (2007). Alunos sobredotados : a aceleração escolar como resposta educativa, Tese de Doutoramento em Psicologia - Área de Especialização em Psicologia da Educação, Braga: Universidade do Minho. Serra, H. (2004). Aluno sobredotado (O): a criança sobredotada, Porto: Legis Editora Tannenbaum, A. J. (1993). Gifted children. Psychological and educational perspectives. New York: Macmillan. Terman, L. M. (1965). The discovery and encouragement of exceptional talent. In W. B. Barbe (Ed.), Psychology and education of the gifted: Selected readings (pp. 8-28). New York: Appleton-Century-Crofts. A Intervenção Psicológica na Sobredotação Valentina Correia - Psicóloga da Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação O aluno com características de sobredotação é visto, muitas vezes, como alguém que apresenta um desempenho excepcional em todas as áreas, que tem sempre boas notas nos testes escolares e que, por ter capacidades muito superiores à média, não apresenta dificuldades na escola ou noutros contextos. No outro extremo, outros vêem-no como um aluno problemático, a quem faltam skills no relacionamento interpessoal e qualidade no desenvolvimento socioafectivo. O que se verifica é que a criança/jovem com características de sobredotação não é um conjunto estático de estereótipos. Primeiro, é uma criança/jovem, e só em segundo lugar apresenta características de sobredotação. Poderá ser vista como uma criança “normal”, com uma capacidade acima da média, numa ou mais áreas, com características e necessidades próprias, diferentes das demais. O sistema educativo parece perpetuar um pouco a ideia da diferença como algo negativo e da criança diferente como a criança problemática e desadaptada (Nogueira, 2002). A intervenção do psicólogo no aluno com características de sobredotação começa na avaliação psicológica. A pluralidade do conceito impõe diferentes metodologias de avaliação psicológica. O direito de veto é atribuído ao quociente de inteligência (QI), contudo, esta medida é criticável como único critério, pelo que se recorre à entrevista e história de desenvolvimento da criança, a inventários de comportamento preenchidos por pais e professores, a testes de aptidões específicas de criatividade e de desempenho escolar, escalas de estilos cognitivos e de aprendizagem, de identidade e auto-conceito, entre outras. Há que atender também à multiplicidade de características que estas crianças/jovens podem apresentar, bem como à importância de diversas fontes de identificação no seu diagnóstico. No global, a avaliação destes alunos deverá ser multi-referencial, contemplar várias áreas e dimensões, utilizar diferentes instrumentos, meios e processos, atender aos diferentes contextos onde a criança opera e aos momentos/estádios de desenvolvimento em que se encontra, particularmente quando apresenta idades muito precoces (Almeida & Oliveira, 2000). O bem-estar psicológico do aluno com características de sobredotação depende, fortemente, da organização dos ambientes e oportunidades socioeducativas que lhes forem proporcionadas (Campos, 2001). Em casa, pais exigentes, hiper-estimuladores, que fazem uma planificação exagerada das actividades do filho, deixando-lhes muito pouco tempo livre ou que o expõem como forma de “status” social podem “asfixiar” a criança, levando-a a situações de stress, com receio de não corresponder às altas expectativas destes. Na escola, atitudes de descrença relativamente ao seu diagnóstico, subestimação do potencial da criança, tarefas rotineiras, apoiadas na memória, na escrita e no pensamento convergente podem levar a um desinteresse e aborrecimento pelas actividades escolares. Em ambas as situações, limitam-se oportunidades de desenvolvimento e crescimento harmonioso. Em ambas as situações poderá ser necessária a intervenção do psicólogo. O psicólogo deve ter um papel fulcral ao nível da prevenção, no despiste precoce de situações de risco, pois ao detectá-las pode iniciar imediatamente, por intervenção directa ou indirecta, junto de pais e professores, um percurso de potenciamento de recursos da criança. Segundo Pereira (2006), são vários os factores de risco que se colocam a esta população. Por funcionarem dentro de um esquema cognitivo diferente do habitual, marcado pelo pensamento divergente e tratamento não sequencial da informação, facilmente “chocam” com o ensino dito tradicional. Correm o risco de mais facilmente se deprimirem e de se isolarem socialmente, dados os interesses atípicos e as preocupações esotéricas que por vezes apresentam. Além disso, para cederem à fonte de pressão dos pares, poderão vir a funcionar em “falso-self”, no sentido da normalização e de se sentirem mais aceites. No contexto familiar poderão ser alvo de adultomorfização - “tu tens obrigação de compreender”, gerar sentimentos de incompetência paterna e desgaste psicológico. A filosofia a adoptar com esta população deve ser profiláctica e proactiva. A prevenção deverá ser o elemento estruturante de toda a actuação neste domínio. Na prática socioeducativa, este princípio deve traduzir-se na implementação atempada de estratégias que deverão actuar como factores protectores de um desenvolvimento equilibrado. Bibliografia Almeida L. S., Oliveira E. P. & Melo A. S. (Orgs.). (2000). Alunos sobredotados: contributos para a sua identificação e apoio. Braga: ANEIS. pp.107-113. Nogueira, S. (s/d). Será que existem crianças sobredotadas em Portugal? In A página da Educação. Acedido em: htt://www.apagina.pt/artigo.asp?id=55 O Portal da Educação. (2001). O sobredotado é um aluno normal. Acedido em: htt://www.educare.pt/ O Portal da Educação. (2001). Sobredotados. Acedido em: htt://www.educare.pt/ Pereira, M. (2006). Educação e desenvolvimento de alunos sobredotados: Factores de risco e de protecção. In Revista Portuguesa de Pedagogia. Ano 39, n.º 2. Coimbra: Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação. Testemunhos Uma Realidade... Diferentes Olhares Jorge Carvalho - Director Regional de Juventude “Grandes realizações são possíveis, quando se dá atenção aos pequenos começos” - Lao Tse É com um olhar atento às potencialidades de cada jovem, que cada vez mais as políticas de juventude se têm confinado, de forma a poder evidenciar em cada jovem, a sua individualidade e o seu talento. O Atelier “Pintar com Pinta”, parceria entre a Secretaria Regional dos Recursos Humanos, através da Direcção Regional de Juventude e a Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação - Divisão Coordenadora, de Apoio à Sobredotação (DCAS), é um exemplo salutar do incentivo ao desenvolvimento da sua criatividade e competências artísticas, numa lógica de reciprocidade e de parceria que, para além de permitir realizar projectos mais abrangentes, resultam numa mais-valia para os participantes e instituições. Efectivamente, conseguiu-se uma dinâmica de excepcional partilha de conhecimentos, valores, experiências, aptidões pessoais e entreajuda entre os jovens com níveis de dotação distintos na área da pintura, que de outro modo, não se conseguiria obter. Jovens com um sentido de partilha e de altruísmo mais elevado, com mais consciência cívica que é do desenvolvimento individual, que se transforma a colectividade. Como resultado, salienta-se a riqueza das interacções, exposições patentes ao público, venda de trabalhos, cujos donativos reverteram para associações de apoio a crianças, oferta de quadros à Unidade de Pediatria do Centro Hospitalar do Funchal. É com profunda satisfação, que enquanto organismo ao serviço da Juventude, avaliamos o resultado deste grupo de jovens criadores, que com os seus pequenos começos, certamente irão continuar no trilho das grandes realizações! Mitos Clássicos: uma forma de conhecimento Joaquim Pinheiro - Docente da Universidade da Madeira Existem diversas áreas do saber que podem suscitar o interesse e a curiosidade dos jovens. A mitologia é, certamente, uma dessas áreas devido ao fascínio que continuam a exercer as histórias míticas criadas por Gregos e Romanos. Voltar aos mitos clássicos é fazer uma viagem a um tempo que é, simultaneamente, tão distante de nós como tão surpreendentemente parecido com a nossa realidade. Assim, conscientes das potencialidades da mitologia, temos procurado seleccionar, como pede Platão na República, os mitos adequados à motivação educacional: a viagem de Ulisses; Aquiles e Heitor, como heróis com valores distintos; a relação do homem com a natureza (Ícaro); o homem e os animais (a luta de Teseu com o Minotauro e o golfinho que salva o herói Aríon); o labirinto de Creta; o amor (expresso pelos ciúmes de Afrodite ou a desventura de Ariadne); o rapto de Europa; o esforço de Héracles; acontecimentos maravilhosos (o nascimento de Adónis, as rosas vermelhas). Da mesma forma que o mito é uma criação humana e uma tentativa de representar ou imitar a realidade, a leitura e análise de cada mito é uma busca, nem sempre fácil, do conhecimento. Aprofundar o sentido de um mito é lançar um olhar sobre um código do pensamento e tentar decifrá-lo. Por isso, o mito acaba muitas vezes por ser um caminho para chegarmos a uma concepção mais concreta, que se confunde com a história em geral, ou mesmo com a nossa própria experiência de vida. Na verdade, a longa e fantástica viagem de regresso de Ulisses a Ítaca, após a queda de Tróia, representa também a viagem que empreendemos em busca dos nossos objectivos e das nossas metas… mas é aí que reside um dos problemas dos jovens. Terei eu metas? Que objectivos orientam a minha vida? Sabemos que é possível encontrar a meta sem termos um caminho definido. É, contudo, mais fácil e até mais rápido quando sabemos aquilo que desejamos alcançar. Note-se, deste modo, como é possível elaborar a partir do mito um pensamento profundo sobre a vida de cada um: preciso de conferir sentido à minha existência. Nessa perspectiva, saber fazer é útil, mas não é menos importante aprender a exercitar e a dialogar com o pensamento, numa fase prévia à acção. Assim, imaginando-nos num laboratório de mitos, decompomos a essência e a mensagem de cada história, experimentamos interligar as aventuras dos heróis e das heroínas e promovemos as nossas próprias composições ou criações. Tal como Luís de Camões, Milton, Tiziano, Rafael, Rubens, Bernini, Guérin, G. Moreau, Rossetti, Rodin, Salvador Dali ou Hélia Correia, da literatura às artes plásticas, reescrevemos os mitos clássicos, transportando para o nosso tempo as aventuras do passado e actualizando o seu significado. De facto, os mitos greco-latinos têm a faculdade extraordinária de serem portadores de novas estruturas de significado, que se ajustam ao modus vivendi de cada sociedade. Por causa da sua ambiguidade e sentido enigmático, o mito – como magistralmente expressou Fernando Pessoa – “é o nada que é tudo”, e por isso abre um campo infinito de interpretações. Logo, o mito pode estimular a reflexão e o diálogo entre os jovens, num sistema de partilha de ideias que visa delinear os principais elementos. Com o amadurecimento desta metodologia, os jovens ganham capacidade de análise reflexiva e textual e, além disso, como se expressam perante os colegas, desenvolvem uma retórica oral suficientemente argumentativa. Também o facto de poderem ser “autores” de uma história mítica os motiva, aperfeiçoando-se, por essa via, a expressão escrita e a capacidade de estruturar e imaginar o percurso de uma ou mais personagens. Se o mito é o reflexo de uma memória colectiva, percebe-se, então, que se torna indispensável para o homem actual conhecer as suas raízes e entender que nada nasceu ontem, mas que as actuais formas de reflexão são o fruto de um contínuo processo de transformação e adaptação, em que passado e presente se fundem na memória humana. Neste contexto, a transmissão e a análise de mitos não é mais do que aprofundar um legado cultural que marcou decisivamente a história do Ocidente e, em particular, da Europa. Alguns países mais informados e conscientes desse passado, como a Alemanha, a Inglaterra ou a Espanha, concedem uma atenção especial à mitologia clássica, por meio de publicações, de encontros de reflexão, de representações artísticas ou dramáticas ou mesmo com a introdução nos programas escolares de matérias relacionadas com a mitológica greco-romana. Parece-nos que esses bons exemplos devem ser imitados, mesmo que seja mediante uma actividade paralela, de carácter facultativo, mas que pode: a) ajudar os jovens a enquadrar temáticas históricas e literárias (facilita, por exemplo, a leitura de várias obras da literatura europeia, como Os Lusíadas ou D. Quixote); b) suscitar o interesse pelas raízes da Civilização Ocidental; c) estimular a capacidade criativa; d) promover o debate de ideias; e) introduzir ou incrementar o gosto pela música clássica e pela arte; f) explorar o gosto pela leitura e auxiliar a descoberta de outros autores. Em suma, acreditamos que a mitologia, como certamente outras áreas do conhecimento, é um apoio importante na estruturação mental do indivíduo, uma vez que ela valoriza a consciência antropológica e apura o engenho. O lúdico e o cultural entrelaçam-se no Museu da Quinta das Cruzes… Ana Bonito - Técnica Pedagógica do Serviço Educativo Em Setembro de 2007 decorreram actividades de enriquecimento cultural de Verão, no Museu Quinta das Cruzes, preparadas pela equipa do Serviço Educativo em colaboração com a equipa da DCAS. Na sequência das orientações das técnicas que já conhecem as preferências lúdicas e culturais e as necessidades educativas destes alunos, foram realizadas actividades. O objectivo deste intercâmbio foi despertar para a importância que os espaços museológicos têm sobre a qualidade das aprendizagens, como áreas de fruição, de educação, de emoções e de encontros. No primeiro encontro foi feita uma dinâmica de grupo para nos conhecermos, designada “A teia da amizade”. Posteriormente, definimos em conjunto as regras de conduta, tendo em conta que todas as crianças são diferentes. Através do concurso “O Património do Museu em Diálogo”, sensibilizaram-se as crianças de modo a identificarem elementos na paisagem que representassem o valor cultural e patrimonial dos sítios, in situ, desenvolvendo assim, o espírito crítico. A temática sobre a qual o concurso se desenvolveu foi inspirada nas Jornadas Europeias do Património cujo tema de 2007 foi o património em diálogo. A visita temática à colecção de Mobiliário foi dedicada aos contadores, acompanhada por uma explicação pormenorizada dos segredos (ou gavetas invisíveis) que estas peças apresentam. De seguida, foi lançado o desafio de criar um contador em miniatura a partir de caixinhas de fósforos, papéis, colas e autocolantes. Com esta parceria, tentámos criar um ambiente desinibidor, onde os alunos desenvolvessem características de criação de novas formas e métodos de realização. Nestas propostas, mostraram persistência na prossecução dos objectivos. Finalizámos a semana com um convite aos pais e familiares a assistir a um pequeno vídeo resumindo todas as actividades desenvolvidas com este grupo. Os alunos sobredotados na escola Jacinta Jardim - Docente Especializada da Divisão Coordenadora de Apoio à Sobredotação A promoção do sucesso de todos os alunos só é possível através da flexibilidade das respostas educativas. Hoje, a escola é confrontada com uma heterogeneidade social e cultural, o que implica outra concepção na organização escolar que ultrapasse a vida da uniformidade e reconheça o direito à diferença. A preocupação da escola em responder às especificidades dos alunos obriga-a a uma descoberta e participação nas vertentes cognitiva e social, assim como à criação de um clima que passe pelo reconhecimento do professor, do aluno enquanto pessoa, com os seus interesses, necessidades, saberes, experiências e dificuldades. Este reconhecimento alarga-se ao grupo turma onde a heterogeneidade se evidencia e exige que não se ensine todos os alunos como se fossem um só, mas que se crie condições para um ensino individualizado (Benavente, 1992; Perrenoud, 1995). A aceitação da diversidade exige o desenvolvimento de uma pedagogia diferenciada com estratégias de ensino adaptadas à aprendizagem de cada um (Meirieu, 1998; Perrenoud, 1995). Esta preocupação ganha uma expressão maior quando os alunos se destacam e apresentam um desempenho superior e excepcional em diversas áreas (Colangelo & Davis, 1997). O aluno sobredotado não é alguém que sabe tudo, que é auto-suficiente e que não precisa de ajuda. Também não é correcto pensar-se que, face às suas altas habilidades e talentos, o sobredotado tenha de ser excelente em todos os domínios da sua pessoa, comportamento cognitivo e aprendizagem. A sua inclusão na sala de aula requer por parte dos professores estratégias pedagógicas adequadas às suas necessidades. Ao contrário do que habitualmente se pensa, os alunos sobredotados podem apresentar insucesso escolar. Este facto não é recente, já em 1909, Binet referia que os alunos sobredotados por vezes não tiram proveito do seu potencial, sendo necessário implementar medidas pedagógicas especiais. Segundo Pereira (2000), estes alunos estão sujeitos a três factores de risco: aborrecimento provocado pela exposição magistral do professor (na explicação de uma hora o que eles aprendem apenas em alguns minutos); disparidade entre o amadurecimento afectivo e intelectual (frequentemente há uma imaturidade afectiva resultado de “imposições” que lhes colocam e que lhes fecha o estatuto de criança) e por último, discrepância entre o desenvolvimento intelectual e desenvolvimento motor. Uma das constatações que frequentemente mais nos surpreendem no seu desempenho escolar é o desfasamento entre a capacidade da leitura precoce e as diferenças de desempenho da escrita. De modo geral, o aluno com características de sobredotação é visto como alguém que revela um desempenho saliente em todas as suas actividades, que demonstra um talento especial para uma ou várias expressões artísticas ou que, no domínio do seu desempenho académico está sempre bem preparado nos exames, é entusiasta, motivado e sem dificuldades, ou que possui uma inteligência acima da média. Pese embora a relevância das suas qualidades particulares, muitas das vezes estes alunos possuem dificuldades várias. Diversos estudos têm demonstrado que existem alunos com altas habilidades que passam despercebidos, por vezes rotulados de problemáticos, com dificuldades no seu comportamento (atenção, interesses, tarefas escolares, desempenho social, …). Sendo a sobredotação um processo, pretende distanciar-se dos mitos em que se encontra envolto, sendo necessária uma definição multidimensional e consensual que possibilite uma intervenção eficaz. É importante relembrar que o direito à diversidade contemplado na LBSE - Lei n.º 46/86, de 14 de Outubro, refere que “o sistema educativo e os professores deverão atender às características intelectuais do aluno”. A convenção sobre os direitos da criança (1989) estabelece que “a educação da criança deverá ser orientada para desenvolver a sua personalidade, as suas aptidões e a capacidade mental e física até o máximo das suas potencialidades”. Segundo Correia (2003), a inclusão pretende encontrar diferentes formas de aumentar a participação de todos os alunos, de acordo com as suas características individuais. Assim, os alunos com características de sobredotação têm o direito a uma intervenção educativa que respeite as suas especificidades. A legislação refere que os alunos sobredotados deverão beneficiar de um programa educativo que contemple medidas que podem passar pela antecipação ou aceleração no percurso escolar e enriquecimento curricular e extracurricular (Despacho n.º 173/91; Despacho Normativo n.º 1/2005 e Portaria n.º 611/93). A última medida deverá incidir sobre uma estratégia integradora baseada na individualização do ensino; na elaboração de um plano educativo próprio; na flexibilização dos conteúdos; nos protocolos/parcerias com outras instituições; no alargamento das fronteiras do currículo; na inclusão de novas unidades de estudo (compactação curricular) e na investigação em temas diversificados. Para promover as capacidades e maximizar o potencial dos alunos, a escola deve respeitar a individualização, contribuindo para uma escola de qualidade. Bibliografia Almeida, L., Oliveira, E. & Melo, A. (2000). Alunos sobredotados: contributos para a sua identificação e apoio. Braga: ANEIS. Almeida, L., Oliveira, E., Silva, M. & Oliveira, C. (2000). “O papel dos professores na identificação de crianças sobredotadas: impacto de variáveis pessoais dos alunos na avaliação.” In Sobredotação. Vol. 1, nº 1 e 2. pp. 83-95. Direcção Geral dos Ensinos Básicos e Secundários. (1992). Crianças Sobredotadas: Intervenção Educativa. Lisboa: ME. Falcão, I. (1992). Crianças sobredotadas, que sucesso escolar? Porto: Edições ASA. Mettrau, M. & Almeida, L. (1994). A Educação da Criança Sobredotada: a necessidade social de um atendimento diferenciado. In Revista Portuguesa de Educação, 7, pp. 5 13. Palhares, C. & Oliveira, E. & Melo, A. (2000). ANEIS: Programas de Enriquecimento. In Sobredotação, 1 (1 e 2), pp. 191-202. Pereira, M. (2000). Sobredotação: a pluralidade do conceito. In Sobredotação. Vol. 1, nº 1 e 2. pp. 147-171. Silva, M. (1992). Sobredotados: suas necessidades educativas específicas. Porto: Porto Editora. Aprender a aprender nas Artes Visuais Marcos Milewski - Professor de Expressão Plástica e Pintura Desde 2005, e durante dois anos, estive responsável pelo Atelier “Actividades de Enriquecimento Expressão Plástica/Pintura” (organizado pela Direcção Regional da Juventude e pela Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação - DCAS). O objectivo foi desenvolver as potencialidades de um grupo de crianças e jovens na área das Artes Visuais. Os dotes artísticos de cada pessoa manifestam-se duma maneira particular e sempre diferente, o que torna muito complexo e, ao mesmo tempo, maravilhoso o ensino do desenho e da pintura. Este é um processo individual, que pode ser partilhado numa experiência de grupo de forma profícua, pois aprendemos muito com as dificuldades e diferentes soluções dos colegas perante os problemas que vão surgindo. Quem ensina tem de estar atento às especificidades de cada um, aos seus problemas e pontos fortes, dado que cada estudante segue um caminho diferente. Quais são os conteúdos desta aprendizagem? Por um lado, dominar os materiais, por outro, reflectir sobre os conteúdos. Para consolidar estes objectivos, trabalhámos a cerâmica, a pintura sobre azulejo, o óleo, concentrando-nos essencialmente em três técnicas: o desenho com diversos tipos de lápis, o pastel e o acrílico. Durante estes dois anos, o grupo cresceu notavelmente no nível do desenho e da pintura, atingindo um amadurecimento na concepção de trabalhos diversificados. Também se instaurou uma dinâmica interactiva que fomentou os laços de amizade e o espírito de pesquisa em grupo. Não há receitas… é preciso respeitar a individualidade de cada jovem Alícia Franco - Docente Especializada da EB2/3 da Bartolomeu Perestrelo Ana (nome fictício) tinha 10 anos e frequentava o 6.º ano na EB 2/3 Bartolomeu Perestrelo. Tinha sido sinalizada como sobredotada no 1.º Ciclo. O seu caso foi-me apresentado pela colega da Educação Especial que a seguiu no ano lectivo anterior. Reconheço que não me sentia muito à vontade, pois ia ser a minha primeira experiência na área. A primeira sessão foi um pouco frustrante mas, ao mesmo tempo, tive uma sensação de alívio. Estava à espera de encontrar alguém que deveria ser ou ter algo “diferente”. Não, esta menina tinha um ar reservado, desconfiado até, aparentava ser tímida e parecia medir as palavras. Fiquei com a impressão de que a avaliação, que lhe foi feita no 1.º Ciclo, não correspondia à realidade. Nas sessões seguintes, não foi fácil trabalhar com ela pois tive de a conquistar, uma vez que era difícil descobrir se tinha ou não gostado de uma actividade, ou se considerava ser boa ideia abordar determinado assunto. Por um lado, e já no final do 2.º período, comecei a perceber que a Ana era uma jovem exigente, perspicaz, curiosa, ávida por saber coisas novas que a desafiassem, com um raciocínio lógico bastante desenvolvido, atendendo à faixa etária, e que manifestava um espírito crítico extremamente apurado, aparentando a maturidade de uma adolescente que está prestes a entrar na vida adulta. Por outro lado, através das nossas conversas, pude vislumbrar uma jovem com algumas atitudes, receios e dúvidas próprias da idade, pois muitas vezes esquecia e ainda esqueço que é muito jovem. Hoje deparo-me com uma situação em que me sinto mais uma tutora, conselheira, cujo objectivo é o de desenvolver as capacidades da aluna, não só ao nível de competências académicas, como sociais, nomeadamente: pensar em níveis conceptuais mais elaborados; apreciar e discutir noções de moral e ética; produzir trabalhos diferentes do habitual; entre outros. Há ainda muito trabalho a fazer, na medida em que ela própria autocritica as suas capacidades e as dos outros, menospreza o seu potencial, aparenta insatisfação e, por vezes, devido ao seu grau de exigência, torna-se intolerante com os pares. Não há receitas… cada jovem é um jovem com características próprias e é preciso respeitar a sua individualidade. Um grupo de alunos “extraordinários” Maria Benvinda Mendonça - Docente da EB1/PE da Nazaré Antes de iniciar o trabalho, idealizei o que iria fazer com aquela turma. Mesmo sem conhecer as suas capacidades e aptidões, imaginava as aulas, as actividades, as estratégias, a relação com os pais... Como motivá-los de modo a que o ensino não se tornasse fastidioso ou desinteressante? Sabia apenas que ia ter uma aluna que dominava a leitura, o que me fez reflectir acerca das estratégias a desenvolver para que esta não se desmotivasse e consolidasse os conhecimentos. Nos primeiros dias senti dificuldade em discipliná-los, pois o respeito pelas regras era difícil de cumprir. Eu via, na maioria dos alunos, muita inteligência, capacidade de aprendizagem e um excelente desempenho. Um grande grupo revelou, desde logo, muito interesse pelo trabalho desenvolvido e aprendia com facilidade e rapidez os conteúdos das diferentes áreas. Chegava a ser, por vezes, bastante stressante, pois nem sempre havia tempo para dedicar àqueles com maiores dificuldades. Felizmente, eram poucos e sentiam-se forçados a avançar, incentivados pelos outros, para quem aprender era perfeitamente natural. Recordo com satisfação essas aulas, discutiam-se métodos, processos, respostas, enfim, havia debate de opiniões e reflexão sobre diferentes temas e problemáticas. Era desafiante ver como se interessavam e se empenhavam para aprender mais, pesquisar e adquirir novos conhecimentos. Ao longo do tempo, mantive um contacto privilegiado com os pais, em reuniões mensais, onde os informava das dificuldades e progressos dos seus educandos, aspecto fundamental para o sucesso de todos. Se me perguntarem o que fiz, porque fiz ou como fiz, simplesmente poderei dizer que a minha preocupação era levar os alunos a adquirirem as competências necessárias para continuarem a sua caminhada na aventura do saber. Costumo dizer que cabe ao professor apresentar o caminho adequado aos seus alunos, mas cabe aos alunos arranjarem pernas para o percorrer, como também cabe ao professor juntamente com os encarregados de educação amparar os seus alunos para que estes não fracassem. A sobredotação era uma área sobre a qual eu pouco ou nada sabia, ou seja, não tinha preparação técnica para identificar se alguns alunos eram sobredotados. Só notava que eram alunos bastante inteligentes, com os quais se tornava, de certa forma, “fácil de trabalhar”. Quando me pediram para fazer um despiste dos alunos com maiores capacidades de aprendizagem, fi-lo sem quaisquer reservas. Os seleccionados integraram um programa de enriquecimento “Ensinar a pensar”. Mesmo depois de eu saber que este grupo tinha características de sobredotação, não mudei a minha forma de estar com eles, nem a forma de intervir, pois achei que estava adequada às suas capacidades. Como tal, dei simplesmente continuidade ao trabalho realizado. Os resultados obtidos foram bastante satisfatórios e recordar estes alunos é sempre uma emoção, por vezes com alguma saudade. Os grupos nunca são iguais mas há sempre aqueles que nos marcam, ficando para sempre como ponto de referência, enchendo cada dia a vida de um professor. Dar importância ao “SER DIFERENTE” Manuela Henriques - Encarregada de Educação Sou mãe de uma jovem sobredotada de 16 anos. Sempre achei a minha filha inteligente, mas nunca pensei que fosse sobredotada… até porque desconhecia o conceito de sobredotação. Hoje apercebo-me que a Ana deve ter passado momentos menos bons na escola, sem ter alguém que a ajudasse e que a compreendesse na sua maneira de ser e estar. A Ana nasceu prematura, sentou-se com 5 meses e começou a andar aos 9. Aos 18 meses já possuía um bom vocabulário e uma boa construção frásica. Aos 2 anos e meio, desenhava muito bem a figura humana e aos 4/5 anos questionava assuntos relacionados com a morte, com Deus e com o mundo. Eu respondia duma forma clara e simples pois achava-a muito nova. Contudo, comecei a perceber que ela não se contentava com as respostas. Na verdade, isso deixava-me angustiada porque no fundo não sabia como havia de lhe responder. A minha família questionava se não estaria a exigir muito dela. Aos 6 anos, a Ana foi para o 1.º ano, onde passou logo às letras, pois já as conhecia muito bem, e juntava-as com muita facilidade, formando palavras. No início, não queria ir para a escola pois achava que a professora estava sempre a repetir as mesmas coisas e não gostava de fazer os TPC’s. No final do ano, a docente estava impressionada, a Ana tornara-se líder da turma, fazia tudo com muita perfeição e estava apta a transitar para o 3.º ano. A minha dúvida era se ela não se adaptasse ou se não conseguisse acompanhar os outros, por isso continuou na mesma turma. Nessas férias, a Ana leu o Principezinho, e ao questioná-la sobre a história, começou a “desbobinar” e a falar da importância da amizade. Foi então que me apercebi que ela não era apenas inteligente... A partir daí, a Ana começou a ler obras de Alice Vieira, de Sophia Mello Breyner, entre outras. Posteriormente, começou a gostar de enciclopédias, de livros científicos e de pesquisar. Ela era feliz com os livros. No dia em que fui buscar a sua avaliação do 5.º ano, a directora de turma comunicou-me que a Ana tinha passado o ano inteiro sem amigos e isolada do grupo e que estava à espera que melhorasse esse comportamento, mas como tal não aconteceu, foi obrigada a dar “satisfaz” no comportamento. Fiquei muito revoltada e saí da escola a chorar e a tentar justificar o seu isolamento, uma vez que ela era boa aluna e nunca me causava problemas. A Ana recusava a psicóloga, dizendo que não tinha problemas e que os colegas da turma é que faziam conversas, sem nexo, só falavam de novelas e a própria psicóloga também não a percebia. Mudou para outra, e apesar de uma melhoria no 6.º ano, o problema manteve-se até ao 9.º ano. Tinha um óptimo relacionamento com os professores, continuava a tirar boas notas, fazia trabalhos com uma perfeição fora do comum, fazia parte dos clubes da escola, elaborava artigos para o jornal escolar, narrativas e poesias para o suplemento das escolas do JM. Todavia, continuava a não se identificar com os seus colegas de turma. Um dia, a Ana falou-me da DCAS e do seu desejo de fazer os testes para ver se era sobredotada. Achei estranho, mas compreendi. A partir dessa data, passou a ser mais feliz, conheceu crianças e jovens como ela, foi a conferências, integrou-se em alguns projectos na UMa, participou num campo de férias (ETC). Como mãe, acho que a família é fundamental no acompanhamento destes jovens. Muitas vezes, eles sabem que são diferentes mas não sabem porquê. Embora haja mais consciência da diferença, ainda há pouca clarificação sobre a sobredotação, quer por parte dos pais, quer por parte dos professores que ensinam todos da mesma forma. Cada um é um ser único e, como tal, tem que ser tratado duma forma diferente. Esta conclusão agradeço à minha filha, pois foi ela quem deu o primeiro passo e tirou-me da ignorância. Vamos aceitar a diferença como um desafio e começar a dar importância ao “SER DIFERENTE”. É melhor passarmos quase despercebidos… Susana Mendes - Encarregada de Educação Há uma grande desconfiança e ignorância sobre esta temática. Se ao menos as pessoas estivessem mais informadas e fossem mais sensíveis perante a diferença, seria meio caminho andado... Pergunto-me se todas as pessoas percebem que existem particularidades diferentes ao nível da facilidade de aprender, compreender, relacionar informação, maturidade, relativamente à sua idade? É claro que a escola tem a função de transmitir conhecimentos e o melhor é ser “standard” e adaptar-se aos seus currículos, sem tratamentos especiais... Porque é que os professores não são capazes de reconhecer e assumir as diferenças? Por exemplo, o professor de Piano, desde a primeira aula, disse que notava que estava perante um aluno que poderia ir longe pois tinha facilidade em aprender... Com a mudança de escola, em que é exigido mais trabalho e estudo, o meu filho até veio a beneficiar. Actualmente, gosta mais dos colegas, de disciplina e exigência, é muito bom aluno em todas as áreas e adapta-se aos programas e estratégias da sala de aula. Muito sinceramente, fiquei farta de comentários do género: “os outros também chegam lá” ou “como eles há mais”, etc. O tipo de respostas habituais... Não me sinto na obrigação de provar o que para mim é uma evidência. Não podemos obrigar ninguém a concordar connosco. Embora seja, acima de tudo, uma questão de justiça, sensatez ou boa vontade, mesmo assim, não podemos sequer esperar que isso aconteça. Este tipo de alunos é motivo de desconfiança. O meu filho tem a vantagem de saber esperar, é discreto, e não tem pretensões de se exibir e essa sim, é uma boa forma de reagir e enfrentar a situação, evitando os comentários depreciativos e desmotivantes. Cheguei pois à conclusão que na escola, tal como na vida, é melhor passarmos quase despercebidos, tendo sempre a nossa própria opinião sobre o que nos rodeia, pois tudo o que foge aos “padrões normais” definidos pela sociedade, não é visto com bons olhos, mas sim com descrédito. Esta minha visão pessimista é fruto da sensação vivida desde o início de todo este processo, após a primeira reunião na escola. Agradeço os esforços da DREER no sentido de ajudar. Muito obrigada! Qual é a importância de saber quem somos? Uma jovem sobredotada Serei a única que pensa assim? Não é uma questão comum no dia-a-dia, mas tem um significado muito especial para aqueles que, assim como eu, foram identificados como sobredotados. Para todos, conhecer outras pessoas com os mesmos interesses e preocupações é vital para um bom relacionamento interpessoal, o que, por sua vez, é importantíssimo, quer para o sucesso da nossa carreira, como para a nossa vida em geral. Neste âmbito, no Verão de 2006, participei num campo de férias especial, cujo nome - ETC (Estímulo ao Talento e à Cooperação) - marca já a diferença. Este campo de férias, organizado pela ANEIS – Associação Nacional para o Estudo e a Intervenção na Sobredotação - é especialmente dirigido a jovens sobredotados, embora esteja aberto a todos quantos queiram participar. As actividades desenvolvidas vão ao encontro de algumas lacunas que encontramos durante o resto do ano nas escolas que não estão aptas a tratar casos como os nossos, ou que não são flexíveis em termos de currículos alternativos. Esta seria uma mais-valia para melhorar o nosso interesse e a motivação na escola pois, ao contrário do vulgarmente pensado por muitos profissionais de educação, é um problema com que nos debatemos numa base regular. Antes de mais, para compreender um ETC é preciso vivê-lo! Nas palavras dos meus queridos amigos: “Nós, o ETC, fizemos com que pessoas que já tinham perdido a alegria de viver renascessem, com apenas umas horas que não nos custaram nada!!!”. A distribuição de sorrisos e abraços, a força e o amor que a Geringonça criou e espalhou ficará sempre em todos os corações tocados pela magia, que certamente despertaram para a necessidade de ajudar o outro sem pedir nada em troca. No espaço-tempo de uma semana vivemos um mundo, daí por mais que escrevesse, ficaria certamente um infinito de coisas por dizer. Pérolas Joana Aguiar - Aluna da Escola Secundária Jaime Moniz Lembro-me de um homem a quem chamavam “poeta obscuro”. Li seus versos como quem entra na sombra, quando em mim as palavras ainda estavam por depurar. Soube depois que ele nascera na minha terra, e desde então senti mais próximo o tear nocturno da poesia, talvez um poeta obrasse no meio da insónia, num redil mais perto da minha morada. Lembro-me ainda que, tempos mais tarde, a respeito de uma rua minha conhecida desde que me conheço, se disse “aqui nasceu um poeta obscuro”, e logo soube que essa rua ganharia, a meus olhos, um misticismo imperecível. Tinha-o encontrado, pensei, muito antes de compreender que os poetas reescrevem a sua morada de nascença. Antes de reconhecer que queria erigir pela escrita, com letras tímidas, um lugar. Há homens que nascem à revelia dos mapas. Antes mesmo de o saberem ou de serem encontrados, aceitam um pacto vitalício com a eternidade. São os arquitectos do porvir. Erguem cidades entre a glória e a queda, e constroem-nas sempre acima do chão, na esperança de adiar o pó com a beleza. Nascem para o sonho sem sono de as construir. “Homens que são como lugares mal situados”, escreveu Daniel Faria, poeta luminoso que a fatalidade cedo quis calar, mas que ainda hoje respira dentro de versos sem raízes terrenas. É por isso que nunca os soube situar nos lugares externos. Penso que, desde cedo, oscilo entre a veemência de uma vida interior demasiado grande, e a exiguidade das concretizações que alcanço. As quimeras não conhecem proporções reais, e é certo que não estão vedadas glórias cimeiras àqueles a quem o engenho e a arte ensinaram a mover. Mas é este o maior desequilíbrio daquele que almeja, esculpe e contempla a obra, porque sente que lhe foi legado, não sabe porquê, como ou quando, um fardo que assume como missão. E que a hipotética obra, a existir, receberá um dia o seu nome vão. Falemos de dotação, e hesitarei. Há epítetos que intimidam, mesmo antes de nos serem dedicados. E, no entanto, não hesitarei em reconhecer que há homens que não caminham, pairam. Não hesitarei em dizer que desconheço a arte, o engenho, a ciência em potência, se isso não existir já entre nós. Latentes, há homens latentes à espera de aprenderem a emergir. De serem encontrados, escrevi. E podem sê-lo muito cedo, com a maturidade em botão, guiados por luzes mais altas que lhes revelam o espaço em volta. E podem sê-lo mais tarde, quando percebem que o desassossego é réplica de um sismo maior. E podem nunca o ser. Tememos sempre fazer parte dos setenta, dos setenta vezes sete homens que ficaram por ser. Por irromper. A arte é o ofício da inquietude. E é tão difícil o amainar do anseio, as casas devastadas pela ascese precoce, o espaço informe que ocupa no âmago uma simples ideia de elevação. Uma chaga aberta pela inspiração. E, por vezes, não encontrar mãos vazias. “Cresceu-me uma pérola no coração / mas estou só, muito só, não tenho a quem a deixar”, escreve Al Berto, e a voz que ouço é a de um homem a quem a virtude não deixou lugar. Estes são os homens sobre quem desceu a diferença. Sobre eles descerá, com ela, o peso dos visionários, a avidez de horizontes, o desenquadramento. Sobre eles deverá descer, também, o amparo. Segurem-lhes as mãos, recolham-lhes a cabeça ardente num peito mais longe da solidão, digam-lhes que não são menos iguais por serem diferentes. Estes homens podem ser os sobredotados. Eu sei que são pérolas. Quero continuar a procurar, descobrir, aprender. Quero criar um novo estilo. Carlota Galvão - Aluna da Escola Secundária Jaime Moniz Não acredito no dom. Pelo menos em algumas áreas. Pelo menos como o idealizam. Um presente de Deus à nascença. A não ser que ao “dom” chamem as circunstâncias da vida que permitiram o desenvolvimento do talento. Esse é o verdadeiro dom - todos os estímulos que recebemos do ambiente que nos levaram à decisão. Mas não tem este talento mais valor do que o outro? Não tem mais mérito aquele que luta por uma bolsa de estudo do que aquele que, sem esforço, lhe pagam a universidade? Não sei o que me levou a desenhar desde pequena. Sei que no infantário fiz a promessa a mim mesma de fazer um desenho diferente todos os dias para que atingisse a mestria nessa área. Simplesmente decidi que queria ser boa naquilo que gostava e fazer disso a minha vida. Estranho dizer isto para quem está no agrupamento 1. Todos pensam que tenho dúvidas sobre o que quero fazer no futuro. Nunca duvidei, não me satisfaz muito a ideia de ser professora. Quero tirar Belas Artes para ser pintora e um curso alternativo para ajudar financeiramente, por exemplo Psicologia. A única diferença entre psicologia e a arte é que numa, emergimos a identidade das outras pessoas através de interpretações dialogadas, e noutra emergirmos a nossa própria e a de outros através da tela, sendo as interpretações uma identidade incerta a pairar em vez de algo indispensável para o acto. Gosto de acreditar na incompreensibilidade e transcendentalidade humanas. São umas das únicas coisas que nos restam acreditar. Até agora sou como uma célula indiferenciada entre outras. Nada mais fiz do que copiar a realidade. Considero que para um artista iniciar a jornada pela sua auto-descoberta, tem que dominar o realismo. Um artista que não o saiba correctamente antes de criar as suas obras de qualquer que seja o movimento artístico, é como um Guilherme Tell que sem experiência de arco e flecha derruba a maçã na cabeça do filho. Todos diriam “Um golpe de sorte! Até eu poderia ter conseguido!”, o que é uma das coisas piores que se pode ouvir. O realismo, além de base, é a desculpa do artista para o seu movimento cujo mérito é polémico (ex.: minimalismo). Mas eu quererei usá-lo como base e nunca como desculpa. Irritam-me as limitações da capacidade mental humana. Sinto-me frustradíssima por perder tempo a estudar o que talvez nunca precisarei em vez de Arte. Outro rumor: a teoria causalista de que o artista é só tudo o que já viu com pequenas variações que acumuladas se disfarçam de mudanças na história da humanidade. De que a criação humana é uma ilusão porque um artista para criar necessita de matéria-prima; não pode criar sem nunca ter contactado com outras obras; não pode criar do nada. Contrario dizendo que o outro ângulo de visão do assunto é o de que a criação humana não pode nascer individualmente. Para criar e evoluir recomeçamos do ponto em que o nosso património até então alcançado, foi deixado. Se começássemos do zero novamente a curta duração das nossas vidas não permitiria a evolução. Porém concebe-se hoje em dia que apareceu o bloqueio de todas as Artes; de que não pode haver inovação. Quero provar o contrário. Não é essa crença sinónima de aproximação do declínio e consequente fim humano? O nosso apocalipse só pode ser digno caso interrompa um fluxo de criação humana infinitamente potencial e não sendo uma consequência do esgotamento das reservas humanas. Não quero que sejamos finitas reservas. Quero continuar a procurar, descobrir, aprender. Quero criar um novo estilo. Os clássicos consideravam-nos (aos estilos) um indício de egocentrismo, de falta de humildade, uma quebra na servidão da estética. Mas todos se esquecem que a arte é mais do que um agrado simpático à vista. Uma Ida ao Teatro “Amor de Dom Perlimplim com Belisa em seu Jardim” Liliana Melim - Aluna do Curso de Animador Sociocultural da Escola Técnico-Profissional ASAS Certo dia, desloquei-me ao Teatro Municipal Baltazar Dias, juntamente com os restantes colegas e com a docente Margarita Câmara. Este programa social e cultural tinha os seguintes objectivos: - sensibilizar e mobilizar a comunidade escolar para a semana da pessoa com deficiência; - conhecer as actividades desenvolvidas pela Divisão de Arte e Criatividade da Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação; - conhecer a participação de pessoas com deficiência nas actividades artísticas; - contactar com pessoas com necessidades educativas especiais (NEE). Enquanto me deslocava em direcção ao teatro não sabia que peça iria assistir, sendo isso, motivo de grande ansiedade e curiosidade. Ao chegar ao local do espectáculo, deram-nos um folheto em que constava o nome da peça “Amor de Dom Perlimplim com Belisa em seu Jardim” e a professora que nos acompanhava informou-nos que alguns dos actores eram portadores de deficiência, pois aquela semana era dedicada à pessoa com deficiência. Ao saber desta informação, a minha curiosidade tornou-se maior, porque não sabia o que esperar perante esta nova experiência. Quando as luzes se apagaram e o pano se abriu fiquei encantada com o cenário, apesar da sua simplicidade, uma vez que com pequenas e poucas coisas podemos fazer algo bonito. À medida que a peça decorria, senti-me uma privilegiada por estar a assistir a uma peça única com pessoas magníficas e tão especiais, cujo desempenho não ficou atrás de actores que não têm limitações. Ao assistir a esta peça vivi uma montanha russa de emoções ao ver o desempenho de tão nobres e fantásticos actores que fizeram, por algumas vezes, com que não conseguisse conter as lágrimas. No fim da peça, enquanto todos aplaudiam de pé aqueles bons actores, pensei que se não fossem perceptíveis visualmente as limitações que aqueles artistas possuíam, ninguém diria que eram portadores de deficiência. Quando caminhava de volta à escola, relembrava a peça no meu pensamento e no quanto eu me senti feliz por ter assistido àquela peça, e ao mesmo tempo, pensava que o preconceito que algumas pessoas têm em relação aos portadores de deficiência, julgando-os menos capazes que os ditos “normais”, não faz qualquer sentido, devendo toda a população assistir a esta peça de teatro para o perceberem. Depois de assistir a este espectáculo, como futura animadora, fiquei com imensa vontade de trabalhar com pessoas com deficiência e de assistir a futuros eventos proporcionados pelos mesmos. Espaço Psi A Actividade Lúdica no ContextoTerapêutico Filipa Serrão - Psicóloga do CAP Câmara de Lobos Lisandra Fernandes - Psicóloga do CAP São Vicente “A maior importância da brincadeira é o prazer imediato que a criança retira dela e que se prolonga sob a forma de alegria de viver.” Bruno Bettlheim Brincar “às bonecas”, brincar “ao pai e à mãe”, brincar “à apanhada” e “às escondidas”, “jogar à bola”… são apenas algumas das brincadeiras a que as crianças se dedicam sós ou acompanhadas, em casa, na escola, no parque infantil e nos mais variados contextos. O brincar, também conhecido como actividade lúdica, é o modo de viver e de crescer das crianças, (Fagulha, 1985) que pode ser definido como um comportamento inato, de carácter recreativo, lúdico e até de entretenimento, com funções evolutivas, adaptativas e com propriedades terapêuticas. Reforçador em si mesmo, o brincar assume-se como uma actividade prazerosa que tem implicações no desenvolvimento da criança (Aguilar & Valle, 2005). O brincar caracteriza-se por relações que a criança estabelece com objectos (não necessariamente brinquedos), com outras pessoas (crianças ou adultos) e consigo mesma (Idem). Estas interacções contribuem para o crescimento e desenvolvimento das diversas facetas da personalidade da criança (Marques, 2002), favorecem a sua aprendizagem sobre o mundo exterior (aumentando o leque de experiências e conhecimentos do mesmo) e o seu mundo interior, conduzindo à consciência de si (Arantes, 2007). Daí a importância do adulto, desde cedo, proporcionar momentos lúdicos no dia-a-dia da criança, envolver-se ele próprio nessas brincadeiras facilitando uma aproximação mútua e uma partilha de emoções (Marques, 2002). Os benefícios do brincar reflectem-se a vários níveis desenvolvimentais da criança: pessoal, emocional e social. É ao brincar que a criança desenvolve habilidades de comunicação e de linguagem, expressa sentimentos, emoções e aprende os processos de socialização. O lúdico permite ainda o desenvolvimento da identidade e da autonomia da criança, uma vez que, ao desempenhar vários papéis sociais e personagens durante a brincadeira, a mesma experimenta outras formas de ser e pensar, ampliando as suas concepções sobre o mundo que a rodeia (Marques, 2002). Outras capacidades acabam por ser favorecidas pela actividade lúdica, tais como a atenção, a memória, a imitação, a crítica e a criatividade, faculdades fundamentais para o desenvolvimento integral e harmonioso da criança e, por conseguinte, para o próprio processo de aprendizagem (Aguilar & Valle, 2005). Atendendo a estas particularidades, o brincar adquire grande relevância no domínio da Psicologia. Ao observarmos uma criança a brincar podemos verificar que as brincadeiras que escolhe, as personagens que nela insere e todo o mundo mágico criado em torno do lúdico, são reflexo do seu mundo interno. Tal como o adulto o faz através da palavra, a criança reflecte na brincadeira algumas dúvidas, angústias, sentimentos, fantasias e ansiedades da sua vivência diária (Arantes, 2007; Marques, 2002). Esta abertura emocional da criança durante o brincar assume um papel fundamental. No campo científico da Psicologia, o brincar é designado por Ludoterapia. Uma proposta psicoterapêutica, essencialmente dirigida à criança, que pode ser desenvolvida individualmente ou em grupo, com recurso ao diálogo e à linguagem do brincar como veículo para a expressão dos seus sentimentos, frustrações, medos, agressividade, inseguranças ou confusões. Assim, o objectivo primordial é promover a expressão e o equilíbrio emocionais, bem como a aquisição de competências que possibilitem um desenvolvimento psicológico saudável (Aguilar & Valle, 2005). A Ludoterapia, na sua essência, facilita o estabelecimento de uma relação de confiança entre a criança e o psicólogo. O sentimento de protecção que daqui advém, possibilita a expressão livre da criança que, aos poucos, passa a encarar o psicólogo como um aliado em quem pode confiar (Levy-Warren, 1994, citado por Aguilar & Valle, 2005). A relação de confiança estabelecida permite ao psicólogo trabalhar questões emocionais e comportamentais, com o objectivo de conduzir à compreensão, reestruturação e equilíbrio psicológicos e, consequentemente, ao bem-estar e desenvolvimento saudável da criança. Este propósito é alcançado quando, em contexto terapêutico, o psicólogo cria momentos lúdicos, onde a criança pode brincar livre e espontaneamente. O psicólogo ao orientar, por exemplo, o jogo dos legos ou a casa das bonecas, possibilita à criança o acesso a condutas e a modelos de interacção funcionais, permitindo, assim, a alteração de comportamentos específicos (Aguilar & Valle, 2005). Do mesmo modo, o jogo interactivo com uma bola ou com os fantoches, podem ser aproveitados pelo psicólogo para ensinar a criança a estabelecer relações interpessoais positivas. Assim, todo o brincar, quando utilizado com rigor metodológico, reveste-se de importância clínica e educativa, tornando-se num potencial veículo de mudança em prol do ajustamento psicológico da criança. Contudo, convém não esquecer que o comportamento lúdico, brincar pelo simples facto de brincar, é também válido por si só, como promotor do desenvolvimento psicológico e socioemocional da criança. Bibliografia Aguilar, G. & Valle, B. (2005). Ludoterapia Cognitivo Comportamental. In Caballo, V. & Simón, M. A. (dirs.) Manual de Psicologia Clínica Infantil e do Adolescente – Transtornos Específicos. Santos Editora, 18, pp. 447- 457. Arantes, D. (2007). Importância do Brincar [versão electrónica] In Jornal da Trofa, n.º 1230. Marques, T. (2002). Como lidar hoje com os fi lhos. (1.ª ed.). Lisboa: Garrido Editores. Fagulha, T. (1985). A actividade lúdica como instrumento de relação na consulta psicológica da criança. Relatório de orientação de aulas teórico-práticas integradas na Cadeira de Consulta Psicológica da Criança e do Adolescente apresentado à Universidade de Lisboa. Lisboa: Universidade de Lisboa. Brinca enquanto souberes! Tudo o que é bom e belo Se desaprende... A vida compra e vende A perdição, Alheado e feliz, Brinca no mundo da imaginação, Que nenhum outro mundo contradiz! Brinca instintivamente Como um bicho! Fura os olhos do tempo, E à volta do seu pasmo alvar De cabra-cega tonta, A saltar e a correr, Desafronta O adulto que hás-de ser! Miguel Torga Legislação Luís de Miranda Correia - Professor Catedrático da Universidade do Minho Educação Especial: Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro Um dia escrevi no prefácio de um livro o seguinte: Actualmente em Portugal a educação está a atravessar um período de mudança, pretendendo-se que ela venha a tornar-se num dos pilares essenciais da formação das crianças e adolescentes portugueses. Esta mudança (...) com certeza que trará benefícios para essas crianças e adolescentes, mas também (...) poderá estar eivada de um certo número de perigos que direccionem algumas práticas educativas para labirintos de onde será difícil sair-se. No que diz respeito às crianças e adolescentes com necessidades educativas especiais (NEE), esta mudança deve ser abordada com cautela, devendo dar-se uma atenção muito especial e fazer-se uma análise aprofundada ao processo como a Educação Especial tem sido orientada e implementada no nosso País, bem como aos problemas que têm afectado uma boa prestação de serviços para os alunos com NEE. O debate aprofundado destas e de outras questões relevantes ao bom atendimento dos alunos com NEE torna-se imperativo. Pretendia com estas afirmações chamar a atenção para a importância de se criar uma plataforma que permitisse a discussão, a levar a cabo por especialistas, professores, técnicos, pais e instituições, no sentido de um dia virmos a ter uma lei que pudesse tornar-se no garante dos direitos dos alunos com NEE e das suas famílias e, simultaneamente, o motor de uma educação de qualidade que permitisse responder com eficácia às características e necessidades desses mesmos alunos. Contudo, este não foi o caso. Para espanto de muitos, sem qualquer tipo de discussão pública, em 7 de Janeiro de 2008, é publicado no Diário da República o Decreto-Lei n.º 3 cuja finalidade é (diz o Governo) a de reestruturar os serviços de educação especial. Porém, ao analisarmos o Decreto, verificamos que ele não considera um conjunto de condições que caracterizam o que comummente se designa por uma educação de qualidade, justa e apropriada às capacidades e necessidades dos alunos com NEE. Melhor dizendo, o Decreto-Lei em questão, contém um misto de aspectos negativos, de cariz acentuadamente grave, que nos leva a reflectir se realmente o seu objectivo é o de promover aprendizagens efectivas e significativas nas escolas regulares para todos os alunos com NEE. Estamos, portanto, perante uma lei que não garante a existência e eficácia dos serviços de educação especial para todos os alunos com NEE significativas (permanentes, como diz o Decreto-Lei) que deles necessitem; que assegure a exacção e a adequação das decisões a tomar quanto à provisão desses serviços; que aprovisione os meios financeiros necessários ao seu bom funcionamento; que considere um conjunto de procedimentos administrativos, preciso e claro a todos os níveis; que tenha por base o conhecimento científico que a investigação credível tem gerado. Assim sendo, ao analisarmos o Decreto-Lei verificamos que a maioria destas premissas não foram consideradas ou foram-no incorrectamente, talvez por duas razões essenciais. Pelo pensamento e a acção que motivaram a sua elaboração estarem arraigados a congeminências políticas, financeiras e sociais. E, como já o referi, pela falta de consulta a especialistas de renome, professores, pais e demais agentes educativos e instituições, e pela inexistência de debate e subsequente discussão pública. Foi talvez a falta deste diálogo que deu lugar à publicação de uma lei incoerente, confusa, que deveria ter por objectivo primeiro elucidar as nossas escolas quanto à forma de responder mais eficazmente às necessidades dos alunos que requerem uma atenção muito especial, apoiada numa miríade de intervenções específicas e de um conjunto de recursos especializados para que, assim, lhes pudessem criar condições que permitissem melhorar a sua qualidade de vida - educacional, socioemocional, pessoal e vocacional. Por conseguinte, estamos perante um Decreto-Lei, sintáctica e semanticamente confuso, bastando, para o confirmar, ler-se o primeiro parágrafo do seu preâmbulo. Retórico, com os chavões que, nesta matéria, já nos acostumámos a ouvir, tal como, “Todos os alunos têm necessidades educativas…”, ficando-se pela oratória em detrimento da conceitualização de termos como, por exemplo, o de inclusão, de educação especial e de necessidades educativas especiais. Pouco original e curial, ao usar a linguagem do preâmbulo no seu preceituado (ver, por exemplo, o parágrafo sexto do preâmbulo e o preceituado no artigo 1.º, ponto 1). Restritivo e discriminatório, ao parecer limitar o atendimento às necessidades educativas especiais dos alunos surdos, cegos, com autismo e com multideficiência (ler com atenção artigo 4.º, pontos 1 a 4), estando, assim, a discriminar a esmagadora maioria dos alunos com NEE permanentes (mais de 90%, representando mais de 100 000 crianças e adolescentes), alunos com problemas intelectuais (deficiência mental), com dificuldades de aprendizagem específicas (dislexias, disgrafias, discalculias, dispraxias, dificuldades de aprendizagem não-verbais), com perturbações emocionais e do comportamento graves e com problemas de comunicação (ex., problemas específicos de linguagem). Mas, na lei, a discriminação também pode ser entendida de uma forma reversiva, uma vez que parece querer empurrar os alunos surdos, cegos, com autismo e com multideficiência para instituições de referência, sejam elas agrupamentos, escolas, ou unidades de ensino estruturado ou de apoio especializado (isto não quer dizer que a modalidade de atendimento para alguns desses alunos não possa ou deva ser outra que não a classe ou a escola regular), contrariando os princípios inerentes à filosofia da inclusão que diz honrar no seu preâmbulo. Nada apoiado na investigação credível, ao propor o uso da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (vulgo CIF), da Organização Mundial de Saúde, (artigo 6.º, ponto 3) para determinar a elegibilidade de um aluno com NEE para os serviços de educação especial e subsequente elaboração do programa educativo individual. Deste facto, dei conta à Senhora Ministra da Educação quando lhe enviei, em devida altura, uma carta em que era visível o posicionamento de eminentes cientistas e investigadores estrangeiros e nacionais, alguns deles envolvidos na adaptação da CIF para crianças e adolescentes, estando todos eles em desacordo quanto ao seu uso no momento presente. Alertei, ainda, a Comissão para a Igualdade de Oportunidades, quando em Julho de 2007 tive a oportunidade de referir na Assembleia da República que, de momento, o uso da CIF em educação poderia trazer consequências desastrosas para os alunos com NEE. Contudo, todas estas preocupações de nada valeram. Mas, o mais caricato é que a CIF que a lei propõe é a versão para adultos e não a CIF-CJ (Classifi cação Internacional de Funcionalidade para Crianças e Jovens) ainda em fase exploratória. E mesmo depois da discussão sobre a sua adaptação para crianças e adolescentes, em Veneza (Outubro de 2007), ainda não existe investigação que aconselhe o seu uso, nos termos que o Decreto-Lei propõe ou em quaisquer outros termos, constituindo-se, assim, como uma ameaça aos direitos dos alunos com NEE e das suas famílias. É ainda interessante referir aqui que, mesmo que se venha a usar a CIF-CJ, ela não poderá sobrepor-se aos instrumentos e técnicas que os professores e técnicos especializados já usam, para além de carecer ainda de muita investigação para se poder avalizar da sua utilidade, como aliás invocam os muitos especialistas que consultei. Um deles (Dr. Don Lollar, investigador/cientista do Centro para o Controlo e Prevenção de Doenças), envolvido no estudo da CIF, depois de lhe ter referido que, quanto a mim, a CIF-CJ era apenas e só um sistema de classificação (uma checklist) e, assim sendo, ter-se-ia de alimentar forçosamente dos resultados das avaliações feitas pelos elementos de uma equipa interdisciplinar, confirmou a minha interpretação, dizendo, I agree with you that the ICF-CY should ‘feed itself on the various evaluations made by the interdisciplinary team considering a student with significant special needs. Assim sendo, mesmo argumentando-se que a CIF poder-se-á constituir como um instrumento aglutinador de determinada informação, arrumando-a em códigos e proporcionar uma linguagem comum (preferiria, uma linguagem universal, porque dada a interdisciplinaridade de todo o processo, comum não será), como é dito por muita gente, em matéria de educação continuo a afirmar que o seu uso é totalmente desnecessário, uma vez que o objectivo não é comparar as capacidades e necessidades dos alunos com NEE permanentes, mas responder individualmente às necessidades de cada um deles (cada caso é um caso) através da elaboração de um programa educativo individualizado (PEI). Mais, a CIF, para além de ainda necessitar de muito trabalho para que possa ser considerada como um instrumento de algum merecimento (como diz o Dr. Lollar, The ICF-CY is in edition 1. Yes, there is much work to be done – long past when I am professionally departed, adiantando, ainda, num outro e-mail que me enviou, I am clear that the ICF-CY will not come to international acceptance, much less use, during my professional lifetime.), contém também um conjunto de imprecisões que é preciso esclarecer, tal como, a aparente confusão entre “actividades” e “participação”, a subjectividade na graduação dos itens (tipo escala de Likert), o excesso de tempo que é necessário para preencher a checklist e, como já referido, a falta de investigação fi dedigna. Por tudo isto, e muito mais que haveria para dizer se o espaço mo permitisse, sou de opinião que se se pretender usar a CIF, então que se use na investigação, mas nunca na educação. Há ainda uma outra situação que nos deixa confusos e que se refere ao atendimento dos alunos surdos, tal com a lei o prescreve. Fica-se sem saber se estes alunos se enquadram no espectro dos alunos com NEE permanentes, receptores de serviços de educação especial, ou se, pelo contrário, fazem parte de uma comunidade, com língua e cultura próprias, que deve beneficiar de uma educação bilingue. Sem pretendermos tomar partido quanto às posições adoptadas pelos indivíduos surdos, a educação bilingue de alunos surdos, descrita no artigo 23.º do Decreto-Lei, deveria ser objecto de legislação à parte, uma vez que os paradigmas que dizem respeito à educação especial nada têm a ver com os que prescrevem a educação bilingue/ bicultural. O simples facto de se introduzir numa “lei de educação especial” o factor da multiculturalidade (neste caso, do ensino bilingue), pode levar muitos a inferirem que todas as crianças e adolescentes de determinada comunidade (ex., cigana, cabo-verdiana, bósnia) devem ser alvo de serviços de educação especial, o que anda muito longe da verdade. O Decreto-Lei n.º 3/2008 é também uma peça de legislação com inúmeras incongruências, muitas delas só justificadas pela falta de atenção que, com certeza, virão lançar a confusão no seio das escolas. Veja-se, por exemplo, o artigo 6.º, ponto 5, que diz que “a aprovação do programa educativo individual” é da responsabilidade do “presidente do conselho executivo”, ao passo que o artigo 10.º, pontos 1 e 2, refere que essa competência é da responsabilidade do “conselho pedagógico”. Veja-se, ainda, o preceituado no artigo 1.º, ponto 2, em que se afirma que “A educação especial tem por objectivos…a transição da escola para o emprego das crianças … com necessidades educativas especiais…” (trabalho infantil?). Mais, o artigo 32.º, alínea b), revoga o artigo 10.º do Decreto-lei nº 6/2001, de 18 de Janeiro, esquecendo-se de propor a revogação do ponto 4, do artigo 12.º, que diz respeito às avaliações efectuadas pelos serviços especializados de apoio educativo. Ainda, atribuir a coordenação do programa educativo individual ao educador de infância, professor do 1.º ciclo, ou director de turma, consoante as circunstâncias, é uma falácia a merecer a mais veemente crítica. É muita a investigação que nos dá conta do cepticismo e, por vezes, da hostilidade dos educadores e professores quanto às suas responsabilidades no que respeita ao atendimento a alunos com NEE nas suas salas de aula. Para além da falta de preparação, muitos deles sentem-se apanhados pela armadilha da “qualidade versus igualdade”, sentindo a “pressão” do sistema quanto à melhoria dos resultados dos seus alunos ditos sem NEE, mas simultaneamente, tendo que responder às necessidades dos alunos com NEE, cujas aprendizagens atípicas lhes exigem competências que não têm e que, caso não lhes seja proporcionado o acesso a serviços especializados adequados, fará diminuir o sucesso escolar. O Decreto-Lei, no entanto, contém também alguns aspectos positivos, dos quais destaco: a) a obrigatoriedade da elaboração de um programa educativo individual para os alunos com NEE permanentes, aliás já consignado no Decreto-Lei n.º 319/91, de 23 de Agosto; b) a promoção da transição dos alunos com NEE permanentes para a vida pós-escolar; c) a confidencialidade de todo o processo de atendimento a alunos com NEE permanentes; e d) a criação de departamentos de educação especial nos agrupamentos (a inserção da área de educação especial nos departamentos de expressões era um absurdo). Todavia, no seu cômputo geral, o Decreto-Lei n.º 3/2008, dada a gravidade dos aspectos negativos que contém, gravíssimos na sua moldura educacional, não serve os interesses dos alunos com NEE permanentes e das suas famílias, comprometendo, até, o futuro da maioria deles. Assim sendo, considero que esta lei deve ser repensada à luz do que devem ser as boas práticas educacionais para os alunos com NEE. Penso que chegou a altura de dizermos, e dizermos bem alto, que estamos perante um problema grave. De tal maneira grave que pode comprometer o futuro da maioria dos alunos com NEE permanentes. Livros Recomendados Qualidade, Inclusão e Diferenciação Autor: José Morgado Colecção: Colecção Teses Editora: Instituto Superior de Psicologia Aplicada Ano: 2003 A qualidade da Educação Inclusiva e os meios para a sua promoção são uma problemática muito debatida. Como tal, a diferenciação pedagógica torna-se imprescindível, atendendo à heterogeneidade discente das nossas escolas. O nível de importância atribuído pelos docentes a práticas pedagógicas promotoras da qualidade nos processos educativos é alvo de discussão, no intuito de se compreender a natureza das dificuldades sentidas pelos professores na implementação dessas práticas no seu trabalho quotidiano, em contexto de sala de aula. Neste sentido, o objectivo primordial deste estudo é providenciar informação pertinente no que concerne ao desenho de programas de formação e à definição de dispositivos de supervisão do trabalho dos docentes. Formação para a Inclusão. Guia Metodológico Autor: Instituto para a Qualidade na Formação, I.P. Colecção: Metodologias de Formação Editora: Instituto para a Qualidade na Formação, I.P. Ano: 2005 O conceito de inclusão introduziu novos moldes para uma intervenção social centrada no propósito de fazer emergir os grupos socialmente excluídos e em situação de desvantagem, envolvendo-os nos processos, de modo a apoiá-los ao longo do seu percurso para a concretização dos seus objectivos. Através de uma reflexão crítica, organizações e profissionais são chamados a debater as suas práticas formativas na tentativa de providenciar novos métodos e ferramentas de trabalho de apoio às competências dos que operam no âmbito da Formação para a Inclusão, de forma a possibilitar uma melhor estruturação nas intervenções, contribuindo para processos formativos de qualidade. Assim, este guia fornece sugestões no sentido de melhorar as práticas de desenho, implementação e acompanhamento de soluções e itinerários para as pessoas em situação de exclusão social. Redes Sociais de Apoio e sua Relevância para a Intervenção Precoce Autor: Ana Serrano Colecção: Educação Especial Editora: Porto Editora Ano: 2008 A investigação na área da Intervenção Precoce tem reforçado a importância dos modelos ecológicos de intervenção. Estes assentam no pressuposto de que o desenvolvimento depende de inúmeros factores, logo, as experiências e intervenções deverão ser variadas e ter por objectivo não só a minimização dos factores de risco, mas também a maximização de oportunidades que influenciarão positivamente o desenvolvimento da criança. Esta perspectiva constitui, assim, o enquadramento teórico no qual deverão assentar, quer as práticas de intervenção, quer a investigação com crianças de risco e suas famílias. A noção de apoio social constitui uma vertente fundamental na abordagem ecológica, de forma a desenvolver sistemas comunitários de apoio que respondam de forma eficaz às necessidades de cada núcleo familiar. TIC – Tecnologias de Informação e Comunicação Passo a Passos O Passo a Passo é um programa simples concebido para desenvolver capacidades de discriminação visual e iniciar o treino de utilização de manípulos. Este software permite que uma imagem seja revelada em etapas, possibilitando que com cada clique, parte da imagem seja descoberta, até que a figura esteja totalmente revelada, momento em que ocorre uma animação musical. No total, existem 22 imagens diferentes que podem ir sendo apresentadas de diversas formas, como sejam elipses, cortinas ou uma nuvem de fumo. O número de passos para revelá-las pode ser definido e varia entre 1 e 20. As actividades podem ser acedidas através de um ecrã táctil, um manípulo ou um rato standard. Comercialização: Anditec, Tecnologias de Reabilitação, Lda. - Alameda Roentgen, 9 C - 1600-757 Lisboa - Tel: 217 110 170 Fax: 217 110 179 E-mail: anditec@mail.telepac.pt - Página Web http://www.anditec.pt Pocket Voice O Pocket Voice é um software de Comunicação Aumentativa e Alternativa que permite substituir os cartões de comunicação que certas crianças com necessidades especiais usam para comunicar, tornando-se um meio multimédia dinâmico com capacidade de reproduzir sons ou uma frase sonora pré-gravada. Este programa possui a vantagem de, para além de poder ser usado em qualquer tipo de computador, poder ser também utilizado num PocketPC, o que permite o uso de frases previamente gravadas numa plataforma portátil, sendo que apresenta uma boa autonomia, o seu manuseamento é simples e é de fácil transporte. Pocket Voice é um software livre que pode ser acedido no site www.acessibilidade.net, no Kit Necessidades Especiais 2004. MegaMix O programa MegaMix é uma colecção de oito actividades diferentes para crianças com idades situadas entre os 3 e os 8 anos. De entre as várias actividades dos jogos Dominó, Música, Apanhar Fruta, Complete a Imagem, Ponto a Ponto e Raspar, podemos encontrar um livro de colorir com selos e carimbos, labirintos, uma banda de música, entre outras. Quanto aos interfaces de acesso, este software pode ser acedido através de um ecrã táctil, de um ou dois manípulos, de um teclado de conceitos ou de um rato standard. Comercialização: Anditec, Tecnologias de Reabilitação, Lda. - Alameda Roentgen, 9 C - 1600-757 Lisboa - Tel: 217 110 170 Fax: 217 110 179 E-mail: anditec@mail.telepac.pt - Página Web http://www.anditec.pt MathType O MathType é um programa interactivo e inovador para Windows e Macintosh que permite criar documentos com expressões matemáticas e possibilita aos utilizadores executar qualquer equação matemática, representando apenas o esquema e não o cálculo. O programa é um excelente aplicativo para a criação de equações matemáticas de todo o tipo. Permite criar fórmulas matemáticas a serem usadas em processamento de texto e/ou publicações electrónicas, páginas Web, apresentações e outros tipos de documentos. Comercialização: Design Sience, Inc. - 140 Pine Avenue, 4th Floor, Long Beach, CA 90802, USA - Tel: +1 (562) 432-2920 Fax: +1 (562) 432-2857 - E-mail: info@dessci.com - Página Web http://www.dessci.com/en/products/mathtype. Formação Iniciou-se, no passado mês de Fevereiro, a acção de formação “Audiovisuais e Edição Gráfica, cujos módulos I – Imagem e Vídeo e II - Captura e Edição de Som decorreram entre os dias 20 e 28 de Fevereiro. A acção, com a duração total de 30 horas, foi dinamizada pelo Técnico Profissional Rui Branco e contou com 12 participantes, entre eles, ajudantes de acção socioeducativa de educação especial, pessoal auxiliar e administrativo, técnicos profissionais de educação especial e docentes especializados. Os objectivos da referida acção consistiram em conhecer e utilizar equipamentos audiovisuais como a câmara de vídeo, microfones e mesa de mistura de som, bem como explorar programas como o Pinacle, o Vídeospin, o Audacity 1.2.6 e Adobe Audition 3, no intuito de capacitar os formandos para a elaboração de trabalhos multimédia. Nos dias 29 de Fevereiro e 1 de Março teve lugar, na sala de formação dos Ilhéus, a apresentação pública dos projectos de investigação e inovação pedagógica dos alunos da Especialização em Educação Especial - Problemas de Aprendizagem e de Comportamento, com a presença das orientadoras Clarisse Nunes, Isabel Madureira e Teresa Leite, docentes da Escola Superior de Educação de Lisboa. Os temas apresentados variaram entre trabalho cooperativo, parcerias, relação escola/família, diferenciação pedagógica, trabalho em equipa, desenvolvimento da linguagem, sistemas alternativos de comunicação, trabalhos de casa, biblioteca e hábitos de leitura, necessidades educativas especiais e inclusão. Notícias Avaliação do Ciclo de Conferências “O Direito à Diversidade na Igualdade de Oportunidades” Fabiana Abreu & Sofia Silva - Técnicas Superiores de Educação A Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação promoveu, no âmbito do Ano Europeu da Igualdade de Oportunidades para Todos (2007), o Ciclo de Conferências - “O Direito à Diversidade na Igualdade de Oportunidades”. A iniciativa percorreu os vários concelhos da Região Autónoma da Madeira (consultar tabela seguinte), com o intuito de descentralizar as dinâmicas formativas e tendo como principais destinatários os diversos actores educativos - docentes, famílias, empresários e sociedade civil da comunidade. Esta foi uma iniciativa gratuita para os participantes, visando promover o imprescindível debate de questões fulcrais como a Inclusão e a Igualdade de Oportunidades para Todos, sempre no encalço de uma sociedade mais justa e solidária. Avaliação pelos Participantes A análise da avaliação incidiu sobre as 6 sessões que compuseram o Ciclo de Conferências - “O Direito à Diversidade na Igualdade de Oportunidades”, com um total de 1344 participantes, sendo que 806 colaboraram, efectivamente, no processo de avaliação. É de salientar que, de forma a facilitar a análise estatística e a própria interpretação dos resultados, foram somadas as respostas de todos os inquiridos, segundo os vários blocos de questões (procedimento subjacente à globalidade da análise, pelo que não há qualquer correspondência directa entre os totais obtidos). Este processo de avaliação pelos participantes atendeu, então, a quatro vertentes distintas, a saber: desenvolvimento da acção, métodos pedagógicos, logística e impacto dos temas desenvolvidos. Em relação ao desenvolvimento da acção e num total de 4030 respostas, as sessões foram, maioritariamente, consideradas boas, nomeadamente quanto aos objectivos atingidos (60%), aos conteúdos abordados (59%), à metodologia utilizada (56%), à duração da sessão (56%) e à classificação global da acção (62%). Quanto aos métodos pedagógicos, obteve-se um total de 4836 respostas e estes foram classificados, em termos gerais, como bons – discurso utilizado (63%), adequação da linguagem ao público (60%), intervenção dos prelectores (58%), motivação transmitida (44%), domínio do assunto (62%) e incentivo à troca de ideias e experiências (42%). As questões de logística também não foram descuradas e procurou-se auscultar a qualidade das instalações, dos equipamentos e dos serviços de apoio. Perfazendo um total de 2418 respostas, este item atingiu padrões bastante satisfatórios, ao ser considerado, na generalidade, como bom e muito bom nas três dimensões avaliadas. O gráfico n.º 4, por sua vez, remete para o impacto dos temas desenvolvidos, tendo sido contabilizadas 3224 respostas. Os participantes revelaram que o impacto dos conteúdos abordados foi uma realidade, sendo que mais de metade dos inquiridos classificou este item como bom - utilidade das temáticas abordadas para a vida pessoal (52%), aplicabilidade à actividade Profissional (52%), adequabilidade às expectativas iniciais (55%) e relação com as necessidades sentidas na vida quotidiana e profissional/concretos (53%). No que diz respeito às observações, e numa perspectiva global, os participantes salientaram aspectos como as conversas paralelas e o ruído que se fez sentir em determinados momentos, a falta de dinamismo e incentivo à troca de ideias por parte de alguns prelectores, bem como o cariz excessivamente teórico de certas apresentações. A falta de um intérprete em Língua Gestual Portuguesa foi também um factor crítico apontado, sendo que se reclamou, paralelamente, um maior poder de síntese e capacidade de gestão de tempo a alguns prelectores. Quanto às sugestões deixadas, estas remeteram para uma maior aposta na apresentação de casos práticos/testemunhos reais para melhor caracterizar a realidade. Por fim, os participantes louvaram a iniciativa, frisando a pertinência e interesse das temáticas abordadas, enaltecendo o trabalho da organização e felicitando os intervenientes nos momentos de expressão musical, plástica e dramática. Teatro de Papel “Norton no Castelo das Flores” Teatro de Papel Bruno Monterroso - Professor de Educação Musical O “teatro de papel” surgiu na Europa no início do século XIX, denominado Toy Theatre. O seu grande apogeu ocorreu em Inglaterra no período Vitoriano (1837-1901), constituindo uma actividade lúdica e educativa. Durante este período, os cenários e personagens eram vendidos pelos famosos Printseller’s, podendo ser destacados, montados e coloridos. Réplicas dos mais famosos teatros ingleses foram criadas para teatro de papel, tendo sido adaptadas, só em Londres, cerca de trezentas peças teatrais. A recriação do teatro de papel, sob forma de conto de Natal, pelo CAO Machico, surgiu da extrema versatilidade que este tipo de produção artística poderá assumir, tornando-se o processo de elaboração, dividido em diferentes etapas, como o principal objectivo. Através da promoção deste evento cultural, pretendeu-se promover a construção transversal de um projecto que pudesse potenciar as capacidades dos jovens com deficiência e desenvolver competências específicas conectadas com as artes performativas. Em Busca do Acto Criativo Após um trabalho de pesquisa bibliográfica, tendo por base contos e fábulas de autores portugueses, sob a temática “Natal”, que pudessem, à posteriori, ser teatralizados, deparamo-nos com uma quantidade avultada de material recente, em que o trabalho gráfico é notável: desenhos a três dimensões, livros com cheiro a morango e baunilha, cores motivantes e acabamentos perfeitos. Mas, no conteúdo escrito, em tudo se confundiam com as histórias dos famosos irmãos Grimm, sendo estas revisitadas por personagens com nomes diferentes mas com a mesma função e enquadramento, não que isto seja necessariamente mau, mas veja-se, dentro do contexto, o processo criativo como uma embalagem colorida de histórias antigas, ressalvando aqui os autores António Torrado e António Mota, escritores de livros infantis que têm encetado um outro rumo. Desta forma, continuava a faltar a história, a nossa história… Ultrapassados os entraves, optámos por elaborar o nosso conto original de Natal, “Norton no Castelo das Flores”. O Processo Redigido o conto natalício, seguiram-se as gravações das vozes das personagens, com a colaboração do psicólogo Márcio Oliveira, da assistente social Paula Viveiros e os docentes Hélder Vasconcelos e Sónia Soares. Depois da construção dos diferentes cenários, adereços e elaboração das personagens, o teatro tornou-se uma realidade. Após os ensaios para a performance, os acertos necessários para as interacções delineadas, a elaboração dos flyers publicitários do evento, pela professora Vera Nídia, as apresentações públicas decorreram, numa primeira fase, na EB 2/3 do Caniçal, seguindo-se o Infantário “Quinta”, na Cancela. Estas decorreram de forma bastante divertida e entusiástica, quer por parte dos participantes, por detrás da tela, quer pelo público-alvo deste evento que sempre se demonstrou interessado no decorrer das actuações, a deslindar pelo brilho nos olhos que conseguíamos observar por entre as mudanças de cenário. STE’s e CAO’s festejam Carnaval Equipa dos STE´s e dos CAO’s Foi com grande entusiasmo e imaginação que as várias instituições da Direcção Regional de Educação Especial e Reabilitação (DREER) celebraram e viveram a época carnavalesca de 2008. Alegria, diversão, fantasia e imaginação foram a tónica reinante nos dias de Entrudo. Equipas e famílias colaboraram com inspiração na preparação dos festejos, para que todos vivessem esta data num clima de boa disposição. Professores, alunos, técnicos e pais empenharam-se na participação de tarefas, desde a elaboração de máscaras enfeites, disfarces, à decoração da escola e organização dos desfiles, pelo que se destacam para além destas, outras actividades, não esquecendo as guloseimas próprias da época. Nos Serviços Técnicos de Educação (STE’s), os programas contemplaram diversos dias de festa, com variadíssimas actividades, entre elas divertidíssimos bailes de máscaras, uma ida à discoteca Vespas como é tradição do STEDI-Colégio Esperança, acompanhados pelos alunos do STEDI-Quinta do Leme. No STEDM/V, não só houve a preocupação de proporcionar aos alunos momentos de diversão, alegria e criatividade, mas também de aprofundar a relação escola/família. Para além das várias actividades já conhecidas, vividas por todos os serviços com muito empenho e animação, também se realizaram concursos de máscaras, construídas com muita arte e criatividade. De igual modo, no STEDA, as festividades carnavalescas culminaram, à semelhança das outras escolas, com o tradicional desfile e baile, ao ritmo da música e da dança. Nos Centros de Actividades Ocupacionais (CAO’s), também a alegria e a exultação do Entrudo percorreram e invadiram os corações de todos, porém, foi no CAO-Funchal que o orgulho se perpetuou naqueles que participaram no Cortejo Trapalhão, uma vez que alcançaram, pelo segundo ano consecutivo, o 1.º Prémio, com Sandokai (nome do grupo), recorrendo a uma dança inédita ensaiada pela Professora Magdalena Miranda e algum improviso. CAO Machico desenvolve Projecto Hélder Vasconcelos - Professor de Educação Física José Olim - Terapeuta Ocupacional No seguimento do projecto iniciado no ano transacto, orientado para as pessoas com mobilidade reduzida do Concelho de Machico, o CAO Machico decidiu este ano, promover a interacção entre os “vizinhos” da EB1/PE de Machico e os utentes do CAO, através de um conjunto de actividades lúdico-desportivas, contribuindo deste modo, para a compreensão e para uma visão positiva, e acima de tudo real, da pessoa com necessidades especiais. Sendo assim, iniciou-se esta 2.ª fase do projecto, com actividades competitivas no meio aquático, realizadas no passado dia 21 de Fevereiro, na Piscina Municipal de Machico, juntando cerca de 50 participantes entre utentes e alunos das referidas instituições. Tendo em conta a natureza deste projecto e os objectivos traçados, optámos por colocar utentes e alunos nos mesmos grupos nas competições colectivas, fomentando deste modo, de maneira ainda mais acentuada, a sua interacção. Estas actividades decorreram de acordo com o planeado e a alegria e competitividade dos participantes foram bem patentes nos seus rostos, naquela que foi, decerto, uma manhã muito bem passada. Seguiram-se outras duas actividades realizadas nos dias 29 de Fevereiro e 5 de Março, com a participação estimada de mais 60 alunos e utentes. SNRIPD passa a Instituto Nacional para a Reabilitação O Secretariado Nacional de Reabilitação e Integração de Pessoas com Deficiência (SNRIPD) apresenta, desde o início do ano, uma nova designação, sendo agora denominado de Instituto Nacional para a Reabilitação. Associada a esta alteração, o Instituto renovou a imagem da sua página Web, sendo que o site possui, neste momento, para além de novos conteúdos, acessibilidade para pessoas com deficiência visual. Os utilizadores que a partir de agora acederem a www.inr.pt podem visualizar a página principal do novo site com uma apresentação mais apelativa e diversas melhorias ao nível da “navegabilidade” do sítio, entre as quais a identificação dos títulos, dos subtítulos e outros marcadores especiais. A diferença está, sobretudo, no aspecto gráfico, uma vez que, no novo sítio foi dada importância à legibilidade dos conteúdos, ou seja, a grande vantagem do site é permitir o uso das ferramentas de acessibilidade a um maior número de pessoas. Campanha de Prevenção na área do Bullying A AMCV - Associação de Mulheres Contra a Violência - é uma organização não governamental que trabalha há mais de 15 anos na área da defesa dos direitos das mulheres, crianças e jovens. Actualmente, está a lançar a campanha de prevenção e sensibilização Stop Bullying, contando com a colaboração de estações de televisão, rádios, jornais e revistas. Os direitos das crianças e dos jovens, e a sua protecção, são hoje reconhecidos na lei, contudo, continuamos a assistir a atropelos diários de direitos fundamentais. O bullying não é uma realidade nova, mas sim um fenómeno crescente na nossa sociedade, ao qual pais, professores e comunicação social têm vindo a dar maior atenção. O bullying é uma forma de violência entre pares, que afecta particularmente crianças e jovens. Ocorre frequentemente na escola, mas muitas vezes ocorre fora do recinto escolar, na rua, nos centros comerciais, nas piscinas, nos campos de férias, etc. Dar-lhe visibilidade contribui para retirar as vítimas do isolamento em que se encontram. A campanha Stop Bullying tem como objectivo consciencializar o público em geral para um problema que é vivido por um elevado número de crianças e jovens no nosso país. Visa em particular alertar pais e educadores para a necessidade de estarem atentos e falarem com as crianças e jovens sobre este tema, bem como sensibilizá-los para a necessidade de procurarem apoio, caso se confrontem com uma situação de bullying. A AMCV apela: - Aos pais e educadores para terem um papel activo na prevenção do bullying. - Às escolas a elaborarem políticas contra o bullying. - Ao Governo para promover estudos sobre este fenómeno que permitam conhecer a extensão do problema e facilitem a adopção de medidas preventivas. Para mais informações, consulte o nosso site: www.amcv.org.pt ou contacte a AMCV através de e-mail: espaco.criancas@amcv.org.pt ou telefone: 213 802 162.