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Canárias atinge 92 milhões de euros em aquacultura; a Madeira não vai além dos 5 milhões de euros

Secretário regional de Mar e Pescas, Teófilo Cunha: "Parece que a questão está em sabermos agarrar no presente oportunidades que com certeza se revelarão vitais no futuro, quer no plano da economia alternativa para não dependermos fortemente do turismo, quer para assegurar emprego qualificado e qualidade de vida às próximas gerações.” 24-08-2020 Mar e Pescas
Canárias atinge 92 milhões de euros em aquacultura; a Madeira não vai além dos 5 milhões de euros

A produção de aquacultura na Madeira deverá fechar o ano de 2020 com uma produção próxima das 1500 toneladas, ultrapassando claramente as 1075 toneladas registadas em 2019.

 

 Com a produção em alta, a faturação segue também em sentido ascendente. De acordo com os principais operadores existentes no mercado regional, a Madeira exporta todos os meses para a grande distribuição 100 toneladas de dourada das 1500 produzidas, o que corresponde a 80 por cento do total da produção. O setor garante já cerca de 80 postos de trabalho diretos e algumas dezenas indiretos.

 

A produção aquícola global entre os países da União Europeia (UE) quadruplicou entre 1990 e 2017, lê-se no documento “Fichas técnicas sobre a União Europeia 2020 – Produção de Aquicultura”. Apesar do crescimento, a UE considera que a produção “permanece relativamente estagnada em comparação com as taxas de produção crescentes de produtos de marisco em viveiro a nível mundial”.

 

O mesmo documento relança as bases da estratégia para o desenvolvimento sustentável da aquacultura europeia, com o Parlamento Europeu a tomar parte nas decisões ao aprovar e publicar a Resolução de 12 de junho de 2018 intitulada “Rumo a um setor aquícola europeu sustentável e competitivo: situação atual e desafios futuros”.

 

Já a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), no relatório “O estado mundial da pesca e da aquicultura 2020 – a sustentabilidade em ação”, aponta para a emergência de combater a fome e a pobreza mundial. Recorda a importância da “Agenda 2030” que insta os países a terem coragem para implementar “medidas inovadoras” que contribuam para aumentar a produção de alimentos.

 

No decurso da cimeira “Objetivos do Desenvolvimento Sustentado”, assinalada em setembro de 2019 e incluída na “Agenda 2030”, o secretário-geral das Nações Unidas, o português António Guterres, apelou às nações para que se mobilizem em torno do “Decénio da Ação” a fim de impulsionar “soluções sustentáveis dirigidas aos principais desafios do mundo”, destacando de entre eles a fome e a pobreza.

 

O relatório da FAO sobre “O estado mundial da pesca e da aquicultura 2020” não deixa dúvidas quanto ao caminho que deve ser seguido: “Pese embora a pesca de captura permaneça importante, a aquicultura comprovadamente já desempenha um papel essencial na segurança alimentar mundial, uma vez que a produção aumentou 7,5% ao ano, desde 1970. Reconhece-se a capacidade da aquicultura para continuar a crescer, mas também sabemos dos desafios ambientais que o setor deve enfrentar à medida que se intensifica a produção. A aquicultura requer novas estratégias de desenvolvimento sustentável. Essas estratégias devem aproveitar os avanços técnicos realizados, entre outros aspetos, em alimentação, seleção genética, biossegurança e controlo de doenças e inovação digital.”

 

Quando se observa a lista dos países europeus que estão na linha da frente na produção de aquacultura, Portugal fica de fora. Situação que contrasta com a extensa plataforma marítima portuguesa, que é a terceira maior da Europa e está em vias de se tornar a sétima maior do mundo, com mais de quatro milhões de quilómetros quadrados.

 

 

Entre os Estados-Membros, os principais produtores aquícolas em 2017 eram Espanha (21 %), França (15 %), Reino Unido (14 %), Itália (14 %) e Grécia (10 %); em conjunto, representavam cerca de 74 % do total da produção aquícola. Contudo, em termos do valor de produção, o Reino Unido era o principal produtor (21 %), seguido da França (16 %), Espanha (13 %), Grécia (12 %) e Itália (11 %). Os moluscos bivalves (mexilhões, ostras e amêijoas) predominam em Espanha, França e Itália. O Reino Unido produz principalmente salmão, enquanto a Grécia produz sobretudo robalo e dourada.

 

 

Canárias versus Cannes

 

Espanha aparece no topo da lista europeia e a posição que ocupa só é surpresa para quem não tem prestado atenção ao crescimento europeu e mundial da aquacultura. O arquipélago de Canárias, vizinho próximo da Madeira, é disso um bom exemplo. Em 2019, a produção de dourada e robalo rendeu, na primeira venda, mais de 92 milhões de euros, numa produção muito próxima das 16 mil toneladas, conforme indica a página oficial do governo canário. A Madeira, no mesmo período, facturou escassos 5 milhões de euros, numa produção de apenas 1075 toneladas

 

Sendo a base da economia assente no turismo, tal como a Madeira, acrescente-se, como nota informativa, que em 2019 entraram em Canárias mais de 15 milhões de turistas. A Madeira, no mesmo ano, recebeu 1,5 milhões.

 

A França é o segundo país da UE com maior produção de produtos de pesca em aquacultura, indicam valores relativos a 2017. De acordo com a Associação Nacional de Piscicultores (CIPA), o volume da produção orgânica abrange principalmente a truta arco-íris e, em menor grau, o robalo, dourada e bivalves (mexilhões e ostras).

 

 

Segundo a CIPA francesa cerca de 2.300 toneladas de truta orgânica (6,5% da produção nacional de trutas) são produzidas anualmente. Além disso, produzem cerca de 700 toneladas de robalo e dourada (15-20% da produção nacional), sendo as principais empresas produtoras a Aquicultura de Cannes (400 toneladas), Gloria Maris (200 toneladas) e Aquicultura de Provence (100 toneladas).

 

Como é referido pela CIPA, Cannes detém uma das mais importantes empresas de aquicultura de França. Recorde-se que Cannes, cidade turística na Riviera Francesa, é famosa pelo seu festival de cinema internacional. O Boulevard de la Croisette, ao longo da costa, está repleto de praias, butiques de luxo e hotéis palacianos. Também abriga o Palais des Festivals et des Congrès, um edifício moderno, com tapete vermelho e a Allée des Stars - calçada da fama de Cannes.

 

Através do Google Earth (vide foto inserida neste texto) é possível observar as instalações de aquacultura situadas na famosa costa de Cannes, a pouco mais de 300 metros da movimentada marginal.

 

O Plano de Ordenamento para a Aquicultura Marinha na Região Autónoma da Madeira (POAMAR) concede que esta atividade deve realizar-se nas “áreas mais apropriadas ao estabelecimento de espécies e sistemas de cultura, compatível com os ecossistemas e recursos naturais marinhos e de forma integrada com outros usuários dos espaços costeiros”.

 

A opinião de cientistas madeirenses

 

O biólogo, professor universitário e investigador Hélder Spínola tem assumido publicamente que o desenvolvimento da aquacultura na Madeira “é inevitável” para responder às necessidades de produtos piscícolas de que a população precisa. O docente defende que, no caso regional, importa ter em conta “alguns cuidados específicos que permitam o mínimo de impactos sobre o mar”.

 

Sobre a discussão em torno da instalação de novas jaulas, o investigador diz que as pessoas “não podem ser guiadas por ideias erradas”, concedendo que compete ao Governo Regional “criar condições para o devido esclarecimento”.

 

Thomas Dillinguer, também biólogo, investigador e docente na Universidade da Madeira tem defendido publicamente o desenvolvimento da aquacultura, alertando, contudo, para a necessidade de alterações que evitem impactos paisagísticos e ambientais negativos.

 

Rúben Eiras, autor do programa de governo que o PS Madeira apresentou às eleições regionais de setembro de 2019, é outro defensor da expansão da aquacultura na Madeira, enaltecendo as “condições únicas das águas da Madeira” e colocando a produção piscícola no vértice do desenvolvimento da economia azul como elemento diferenciador.

 

 

Secretário regional de Mar e Pescas, Teófilo Cunha: “Temos de saber aproveitar as nossas oportunidades”

 

Desde que assumiu a condução da pasta do Mar e Pescas, Teófilo Cunha tem procurado ser didático em relação a este tema. “O Governo Regional está disponível para esclarecer as pessoas e mostrar evidências científicas de que, até agora, não há registos de que a aquacultura represente um perigo para a saúde pública. Se existisse algum problema já teria sido reportado pela comunidade científica e pelas organizações internacionais responsáveis pelo controlo e saúde alimentar. Muitos dos países que estão na linha da frente no índice de desenvolvimento humano, como a Noruega e a Holanda, têm feito investimentos relevantes na economia azul e na aquacultura e não há registo de qualquer problema.”

 

O governante aponta ao futuro: “Temos de saber aproveitar as nossas oportunidades únicas. Com o conhecimento, a investigação e a ciência, explicando e elucidando as populações. Temos condições para criar riqueza e novos empregos qualificados. A aquacultura é, em todo o mundo, um dos principais motores da economia azul e a forma ambiental mais equilibrada de assegurar o acesso das populações ao consumo de peixe, evitando a erosão do meio marinho e a extinção de peixe selvagem.”

 

Teófilo Cunha transmite segurança às populações, declarando: “A própria ciência também está atenta à evolução da aquacultura. Para além da estratégia preventiva baseada na segurança sanitária e numa cadeia de controlo da qualidade e higiene que vai do mar à mesa, hoje já se fala na possibilidade de jaulas submersas e utilização de meios tecnológicos evoluídos para alimentar os peixes. Assim sendo, parece que a questão está em sabermos agarrar no presente oportunidades que com certeza se revelarão vitais no futuro, quer no plano da economia alternativa para não dependermos fortemente do turismo, quer para assegurar emprego qualificado e qualidade de vida às próximas gerações.”

 

Fonte: reportagem DN Madeira

 


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